quinta-feira, 8 de abril de 2010


CLÓVIS ROSSI

Subdesenvolvidos. E felizes

SÃO PAULO - Não deixa de ser uma cruel ironia que o Brasil seja tratado universalmente como potência emergente no momento em que sua cidade mais bonita submerge por inteiro.

Os patrioteiros de plantão dirão que qualquer cidade se afogaria com tanta chuva. É verdade, mas é só parte da verdade. Menos mal que o prefeito do Rio, Eduardo Paes, e o governador, Sérgio Cabral, tiveram o bom senso de acrescentar "problemas estruturais" ao excesso de chuva como responsáveis por tamanho estrago.

"Problemas estruturais", do tipo ocupação selvagem de encostas, como afirmou Cabral, é uma maneira elegante de dizer que o Rio, como o Brasil, não é emergente, é subdesenvolvido.

Pena que Deus, ou a natureza, ou quem seja, vira e mexe envie lembretes a respeito. Hoje, no Rio; ontem, em São Paulo; anteontem, em Angra dos Reis; antes de anteontem, em Santa Catarina; amanhã, sabe-se lá onde.

No mesmo dia em que os jornais se ocupavam com a tragédia carioca, saía pesquisa de uma financeira que pretendia mostrar que estamos emergindo, mas que prova o inverso. Ficamos sabendo que a classe C (ou classe média) foi a que mais se expandiu em 2009, sinal de que já não somos tão pobres.

Não? Vejamos: a renda familiar (a familiar, não a individual) mensal da classe C é de R$ 1.276, o que dá um pouco mais do que dois salários mínimos e bem menos do que os R$ 1.995,28 que o Dieese considera o valor necessário (do mínimo, não da classe média, que, como o nome indica, deveria estar acima).

Comparemos agora com a Espanha, o país rico mais "comparável" com o Brasil: cada desempregado espanhol recebeu em fevereiro, na média, 900, equivalentes a R$ 2.110, ou 65% mais que a renda da classe média brasileira. E os desempregados espanhóis não são chamados de emergentes.

crossi@uol.com.br

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