quinta-feira, 15 de abril de 2010



15 de abril de 2010 | N° 16306
LETICIA WIERZCHOWSKI


Meu pequeno aluado
Meu filho come luas.

Explico-me: numa viagem que fizemos, meu menininho provou de uns cereais integrais coloridos em vários formatos, um deles muito parecido com uma minúscula meia-lua amarela. Apaixonou-se com um ardor digno dos seus dois aninhos, o que me obrigou a voltar com várias caixas do dito cereal na mala, e agora ele come luas diariamente.

Anda atrás da gente pedindo luas com uma urgência que nos faz rir. De fato, enluarou-se ainda há pouco e agora está saciado, brincando calmamente com seus carrinhos. Olhando-o na sua plenitude, ajoelhado no chão da sala, penso em como é mais bonito enluarar-se do que simplesmente fartar-se de alguma coisa!

Convenhamos: crianças são a coisa mais poética do mundo. Também me inspiro com o pôr-do-sol, mas crianças são de fato bastante mais animadas, além de imprevisíveis. Ademais, caso a alegria infantil esteja semi-escondida por alguma nuvem escura, o mau tempo é sempre passageiro.

A gente está lá no maior tédio, olhando os dias como se eles realmente fossem um apanhado de compromissos, faturas, consultas médicas e reuniões, quando de repente surge uma criança e faz baixar a cortina de fumaça que nós, adultos, estendemos por sobre a nossa vida cotidiana. Você imerso na sua fantasia em preto e branco e lá vem a criança com um choque de realidade colorida.

Vejo meu pequeno saturno andante com seu potinho cheio de luas e seu sorriso mais luminoso do que um sol e fico com o peito aquecido pela felicidade.

Dificil esquecê-lo e escrever sobre outros assuntos, e então aqui estou, rascunhando, sorridente, essas linhazinhas.

Terças e quartas-feiras e todo o resto da minha sequência de dias deixam de ser horas de isso e daquilo e ganham a verdadeira dimensão da sua grandeza: um milhão de minutos, centenas de horas inteiras para ouvir esse riso borbulhante, beijar esse pescoço perfumado, abraçar esse corpinho inquieto e fazer coro às suas músicas prediletas – enfim, ver a vida desabrochando nele por todos os seus poros.

De qualquer modo, sempre gostei muito de medialunas – e exagerei um pouco durante essa minha última gravidez. Se minha avó Maria estivesse viva, haveria de olhar-me com aquele seu jeito sereno, concluindo num sorriso: lá vem mais um aluado para a nossa família. O que era previsível – a fruta não cai longe do pé, e os satélites necessáriamente orbitam o seu planeta.

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