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sexta-feira, 9 de abril de 2010
09 de abril de 2010 | N° 16300A
PAULO SANT’ANA
Pendurado no morro
Assistimos todos pesarosos ao que se passa no Rio de Janeiro, as cenas da televisão parecem ser de um terremoto, as equipes de bombeiros resgatando mortos e feridos, verdadeiros tobogãs rasgados pelas enxurradas, a triste, dramática e fatal vida das pessoas que, não tendo terrenos firmes para morar, vão fixar-se nas encostas.
Ai, barracão, pendurado no morro
E pedindo socorro
A cidade a seus pés
Ai, barracão, tua voz eu escuto
E não perco um minuto
Porque sei que tu és
Barracão de zinco
Tradição do meu país
Barracão de zinco
Pobre tão infeliz.
É exatamente isso o que diz a letra célebre do samba. São pessoas que moram naquele abismo porque não têm outro lugar em que morar, livres de impostos, de taxas de condomínio, de luz e de água, pertinho do céu e no centro do inferno.
Nossas roupas comuns dependuradas
Na corda qual bandeiras agitadas
Parecia um estranho festival.
Roupas dependuradas, móveis dependurados, filhos dependurados, vidas dependuradas.
Vivem lá como se dormissem à beira de um vulcão, sabem que são condenados à morte, não é necessário um terremoto para que tenham suas vidas extintas, basta uma chuva forte e tudo desliza morro abaixo para a destruição.
Mesmo quando os barracões não se despegam das encostas, suas vidas são penosas. Se é difícil descer daquelas encostas, imaginem quão mais quase impossível é subir até lá todos os dias, levando comida, crianças no colo, os utensílios para sobreviver naquela subida de penúria e sacrifício.
Como deve ser difícil escalar diariamente aquelas encostas, às vezes na escuridão da noite, todos os dias e todas as noites aquela aventura inóspita, aquele esforço inaudito na luta pela sobrevivência.
Assim como cantava o Lupicínio:
Eu vou mudar o meu barraco mais pra baixo
As minhas pernas já não podem mais subir
Alto do morro era bom na mocidade
Na minha idade a gente tem de desistir
Subir o morro antes era brincadeira
Até carreira eu apostava e não perdia
Quando eu subia todo mundo me aclamava
E reclamava toda vez que eu descia.
Há séculos as encostas caem no Rio de Janeiro, há séculos há deslizamentos nos morros, há séculos os barracos se despegam das encostas e são cumpridas as sentenças de morte contra os favelados.
Tanto que em 1895, o grande carioca Machado de Assis já escrevia: “Que dilúvio, Deus de Noé (...) a princípio não tive medo: cuidei que eram essas chuvas que passam logo.
Quando porém os elementos se desencadearam deveras e as ruas ficaram rios, as praças mares, então supus que era realmente o fim dos tempos. As águas entravam pelas casas, outras desciam os morros, cor de barro”.
Ai, barracão, pendurado no morro!
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