sábado, 17 de abril de 2010



18 de abril de 2010 | N° 16309
DAVID COIMBRA


Duas mulheres nuas na banheira

Quando Gledson abriu os olhos pela primeira vez naquela manhã e viu que estava nu, numa banheira estranha, ao lado de duas mulheres igualmente nuas e igualmente estranhas, naquele exato momento Gledson tomou a decisão:

“Vou me casar”.

Ergueu-se com dificuldade da banheira. Sua cabeça rodava. Equilibrou-se precariamente. Olhou para as duas desconhecidas. Ambas esguias, porém sinuosas, uma loira dourada, outra morena da cor da canela, do cheiro do cravo.

Dormiam num abraço terno. Achou que já as tinha visto antes. Pensou. Pensou. Então lembrou-se: a propaganda de cerveja! Mas como se chamavam mesmo? Espremeu a memória, mas de lá só saíram dor e remorso.

Cristo!, ele não sabia nem o nome das mulheres com quem se regalara a noite inteira, mulheres com quem compartilhara a mais sórdida intimidade. Sacudiu a cabeça e repetiu baixinho, numa autocensura:

– Gledson, Gledson...

Seu pai havia lhe dado esse nome em homenagem a uma antiga marca de calças. O velho Protásio fizera muito sucesso dentro de umas calças Gledson verdes e acreditava que, se pusesse no filho o belo nome da grife, o menino teria igual sorte ao crescer.

Estava certo. Gledson cresceu, guapo e forte, e alçou-se a uma posição que está no topo da cadeia alimentar no Brasil: tornou-se centroavante. E centroavante goleador!

Como centroavante goleador, Gledson auferiu fortuna e fama. Era convidado para festas todos os dias e todos os dias ele aceitava os convites. Passava as noites cercado por mulheres quentes, bebidas geladas e bajuladores mornos. Atrasava-se para os treinos.

Rompeu com a noiva, a meiga Rosinha, e desde então nunca dormiu antes das seis da manhã. Era uma vida de excessos, uma vida de loucuras que nada tinha a ver com a educação austera que recebera do velho Protásio nem com o carinho suave que lhe destinava a meiga Rosinha. Aquela vida insana, sem regras nem freios, aquela vida que estava acabando com sua vida podia ser resumida na cena que Gledson via agora: duas mulheres lindas, nuas e desconhecidas dormindo enrodilhadas numa banheira.

Não, não, ele precisava dar um basta naquilo. Precisava não de uma mulher, mas de uma esposa; precisava dos dias iguais, das noites bem dormidas; precisava dos domingos de Faustão e dos sábados de Supercine; precisava das jantinhas com casais, do bem comportado sexo com amor. Aliás, não queria mais sexo, queria atividade reprodutiva.

Queria o boa noite da meiga Rosinha logo após o boa noite do William Bonner, e um beijo efêmero no rosto antes de submergir num sono restaurador; queria o pijama e o café da manhã com scrambled eggs; queria as manhãs, não as madrugadas; queria a vigilância de uma esposa com robe de chambre e chinelas; queria que alguém lhe tolhesse os movimentos, que o recriminasse quando ele chegasse em casa com bafo de cerveja, que o chamasse de Pitchuquinho; queria a monotonia, a mesmice, a rotina de um casamento.

– Quero casar! – gritou.

E seu grito despertou as meninas que dormiam na banheira. Elas se enroscaram com a graça de felinas, olharam para o alto e viram o centroavante.

– Vem, Gledsinho – miou a loira.

E ele foi

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