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quarta-feira, 28 de abril de 2010
28 de abril de 2010 | N° 16319
DIANA CORSO
Sonata de Outono
Amor de mãe é coisa muito bonita, da qual muito se fala nestes dias de outono, mas sua ausência pode tornar-se uma verdadeira obsessão para um filho. Notamos que quanto mais um filho for compulsivamente dedicado à sua mãe, quer seja na prática ou nos pensamentos, tanto menor será sua certeza de ter sido amado por ela.
Se o vínculo materno-filial for consistente, seus protagonistas poderão tomar distância um do outro, sem pensamentos doentios de preocupação ou mágoa. Amor de mãe é como uma pedra fundamental: se a qualidade dessa base for pouco sólida, ao filho caberá preencher essa falha através de uma convocação interminável para que a mãe, ou mesmo as memórias dela, lhe ofereçam o sentimento de consistência que lhe falta.
O filme de Bergman, Sonata de Outono (1977), é um clássico sobre as mazelas de ser um filho pouco amado. É a história de uma mãe que viaja muito, deixando para trás um marido entristecido, acompanhado de Eva, a filha angustiada e atenta, e sua irmãzinha, uma doente crônica.
Eva admira a mãe, pois Charlotte é uma talentosa pianista, mas observa o peso insuportável que a família representa para ela, ao mesmo tempo em que cobiça o reconhecimento daquela que está ausente mesmo quando volta. A busca desse amor materno fugidio torna-se para a filha um modo de vida, cresce como alguém que não pode imaginar-se amada.
Já madura, Eva encontra um marido em cujo amor ela não se deixa crer, vivem anos de rara felicidade e têm um filho, que infelizmente morre ainda criança. Ela não se desespera, sua vida parece destinada a ser truncada no que diz respeito à maternidade.
Um dia é da caça e outro do caçador: após anos de distanciamento, Eva convida Charlotte a visitá-la. A teia está armada e o confronto, inevitável: num discurso ruminado por décadas, Eva acusa de forma implacável a mãe narcisista, enquanto esta procura justificar-se, alegando sua fragilidade, que a fazia esperar amor e proteção da própria filha.
A mãe abrevia a visita, sua partida precipitada é a prova de que a filha está vingada. Porém, quem dará valor a uma vida que ela sempre considerou medíocre frente à fama da mãe, quem vai ressarci-la do preço que pagou pela dedicação a essa mágoa?
Homenagens dos filhos nas datas festivas são bem-vindas. Mas essa personagem de Bergman, norteada pelo ressentimento, nos ajuda a perceber outro valor: acima de todas as coisas, às mães deveríamos agradecer-lhes quando usufruímos da leveza do vínculo. Entre mães e filhos, o maior presente é a possibilidade de ir e vir, em paz com o sentimento de continuarem existindo.
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