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sábado, 28 de fevereiro de 2009
01 de março de 2009
N° 15894 - MARTHA MEDEIROS
Querer entrar
O filme O Curioso Caso de Benjamim Button é bem elaborado e tem algumas cenas para constar do rol das inesquecíveis, mas é uma história tão surreal que merecia uma direção mais amalucada e divertida, a exemplo do espírito do conto de Scott Fitzgerald que lhe deu origem. E Brad Pitt poderia ter se esforçado mais, dá a impressão de que entregou o papel nas mãos do maquiador e do computador.
Ou seja, me pareceu um bom filme, mas não me tocou. A verdade é que continuo preferindo histórias dolorosamente reais e enxutas, a exemplo de Foi Apenas um Sonho, o meu candidato ao Oscar, se ao Oscar ele tivesse concorrido.
Belo casal mora numa bela casa com um belo jardim e belos filhos. O marido está adaptado à rotina, mas a mulher arrasta correntes. Sente-se uma estrangeira dentro da própria vida. Queria ser alguém especial, e não apenas mais uma como as outras, com um destino facilmente presumível: repetir os dias.
Em determinado momento do filme, um diálogo rápido e cortante resume seu estado de espírito. Ao se abrir com o vizinho a respeito desse seu vazio inquietante, ele se mostra compreensivo: “Eu entendo. Você queria sair dessa, não?”. Ela responde: “Eu queria entrar!”.
É o toque de mestre do diretor Sam Mendes, que mais uma vez acerta a mão ao tratar sobre o desespero de se deixar engolir pelo caminho mais fácil: viver a vida de todo mundo.
Kate Winslet, excelente no papel da dona-de-casa entediada que sonha em ser atriz e morar na França, inverte o lugar-comum com essa sua resposta inesperada. Vivendo um cotidiano aparentemente perfeito, ela não está dentro do jogo - está fora. Não está enquadrada - está vivendo à margem. Sua intuição diz que a vida acontece no imprevisto, na mudança, no movimento, nos mergulhos culturais, na troca de ideias, estando em trânsito, e não estacionada.
Ela está presa do lado de fora. Não precisa sair, já foi “saída” pelo comodismo, já está expulsa do seu paraíso imaginário, lá onde ela não seria mais uma, ao menos não a seus próprios olhos.
Pode dar a impressão que ela é a antenada do casal, e ele (Leonardo DiCaprio, extraordinário, colocando Brad Pitt no bolso) é o careta, o conformado, mas não é bem assim. A questão não se trata de quem sonha mais alto. A questão é: você está dentro?
Não interessa se a porta que você escolheu abrir te leva pra uma casa no meio do mato, para a movida madrilenha, para um ashram na Índia, para um farol numa ilha desabitada ou para uma cobertura em Nova York – são apenas cenários, enquanto que o dilema a ser resolvido em nossas vidas está no roteiro: você está satisfeito com a condução do seu personagem?
Se avaliar sua própria história até aqui, dá pra dizer que era esse o filme que você sonhava participar? Sente-se confortável no seu papel, seja ele qual for?
Então está dentro.
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