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segunda-feira, 16 de fevereiro de 2009
MOACYR SCLIAR
Casamento virtual
O mundo todo queria vê-lo casado com uma personagem de história em quadrinhos, nova ou antiga
Japonês faz campanha on-line para "casar" com personagem de desenho animado. O japonês Taichi Takashita iniciou uma campanha na internet para conseguir que seres humanos possam se casar com personagens de desenho animado, e já tem o apoio de milhares de pessoas.
"É amor real, mesmo que a pessoa seja ficcional. Gostaria de ter autorização legal para o matrimônio", disse. Folha Online
DEPOIS DE MUITOS abaixo-assinados, de entrevistas para a TV e até de demonstrações na rua (muitas pessoas usando fantasias do Pato Donald, do camundongo Mickey e de Minnie) a campanha finalmente teve êxito: o casamento com personagens de desenhos animados finalmente foi reconhecido como legal pelas autoridades.
Com o que ele deveria ficar contente: afinal, tinha liderado a campanha, ficara conhecido internacionalmente por isso.
Mas a verdade é que estava apreensivo, muito apreensivo. O mundo todo queria vê-lo casado com uma personagem de história em quadrinhos, nova ou antiga. Um empresário de telecomunicações chegara mesmo a oferecer-lhe uma fortuna para mostrar a cena histórica antes dos concorrentes. E casar ele queria, mas, e aí vinha o problema, quem seria sua eleita?
Gostava de todas, mas de nenhuma em especial. Sua indecisão já estava gerando estranheza entre os fãs, revolta mesmo. Milhares de pessoas que tinham apoiado sua luta agora sentiam-se frustradas, enganadas.
Ele precisava se casar com uma heroína de quadrinhos ou de desenho animado. E se nenhuma delas fazia bater mais forte o seu coração -o jeito era criar uma amada virtual. Foi o que ele fez.
Recorreu a um amigo de longa data que fazia curtos filmes de animação para a tevê. Explicou-lhe o dilema que estava vivendo, pediu sua ajuda. O amigo vacilou: não costumava produzir personagens por encomenda. Mas amigo é para essas coisas, e resolveu atender o pedido.
Durante dias discutiram como seria essa mulher de sonhos. Jovem, claro, e bonita, mas isso não era suficiente: deveria ser alguém muito especial: uma princesa, dessas de histórias antigas.
O produtor então fez o desenho animado, com uma historinha simples e clássica: princesa é raptada por um feiticeiro, o herói resgata-a. Apaixonam-se, casam, vivem felizes para sempre. O herói era, naturalmente, o líder da campanha pelo casamento virtual.
O filme teve enorme sucesso e o casamento foi devidamente registrado num tribunal. Mas o personagem principal da história, o rapaz que havia liderado a campanha pelo matrimônio com personagens imaginários, esse não estava satisfeito. Ao contrário, sua vida transformou-se num inferno.
Por causa dos ciúmes, naturalmente.
Cada vez que, junto a seu amigo produtor, ele revê o desenho animado (e isso acontece com frequência) a suspeita cresce dentro dele: tem certeza de que, da tela, a princesa lança olhares sedutores para o seu criador.
É uma situação que não aguenta mais, e para a qual só vê uma solução: a separação legal e definitiva. Quer que a lei garanta divórcio para aqueles que, equivocadamente, casaram com personagens virtuais. É a única forma de recuperar a sua dignidade. Pelo divórcio virtual ele fará qualquer campanha.
MOACYR SCLIAR escreve, às segundas-feiras, um texto de ficção baseado em notícias publicadas na Folha
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