terça-feira, 4 de janeiro de 2022

 Shangri-la, a capital da magistratura

 GERSON KAUER/DIVULGAÇÃO/JC



Última semana antes do recesso, o Doutor Sofrenildo - advogado zeloso - matutava sobre as perdas da semana: 1) Uma audiência não realizada por pane na internet; 2) Outra audiência adiada porque a juíza entrara em licença; 3) Uma reintegração de posse frustrada, porque o esbulhador exibira, ao oficial de justiça, um quente atestado que comprovava estar ele acometido de Covid-19; 4) Meia dúzia de diferentes alvarás não expedidos porque os autos se encontravam "conclusos" aos respectivos magistrados.

E por aí...

Foi então que o Doutor Sofrenildo lembrou-se de uma sugestão dada por um conselheiro da Ordem Internacional dos Advogados: "Pega um veículo, toma o rumo do Himalaia e, nos condomínios de luxo dali, encontrarás magistrados disponíveis a receber advogados e a prestar-lhes pronta prestação jurisdicional presencial".

Assim fez. O Doutor Sofrenildo foi direto a Shangri-la, aquela da criação literária de 1925 do inglês James Hilton, definida como um lugar paradisíaco situado nas montanhas do Himalaia. Um local onde o tempo parecia deter-se em um ambiente de felicidade e saúde, com a convivência harmoniosa entre pessoas das mais diversas procedências.

E nessa conjunção prazerosa, o Doutor Sofrenildo adentrou em um ecológico condomínio, anunciando-se como "advogado militante, interessado em falar com o Juiz Doutor Otoniel e seus colegas que aqui residem". De imediato, educados seguranças facilitaram-lhe o acesso. Em meia dúzia de modernas quadras de tênis, todas com vista para um embasbacante mar azul calipso, realizava-se o "Permanente Jus Campeonato de Beach Tennis".

Percebendo o visitante, todos os magistrados tenistas interromperam as respectivas partidas e recepcionaram o Doutor Sofrenildo, a quem perguntaram em coro: "Em que podemos ajudar?".

Modesto, o advogado explicou: "Tentando melhorar o meu Natal, após mais um ano de tantas perdas, aqui venho em busca das assinaturas de Vossas Excelências. Suplico pelo menos três dos seis alvarás a que faço jus, após demorados processos".

Enquanto o garçom oferecia gelada água de coco ao visitante, dois estagiários rapidamente se movimentavam. Assim, em poucos minutos o advogado recebeu não os três, nem os seis, mas sete alvarás - o último deles relativo a um inesperado e polpudo precatório vintenário.

Antes que agradecesse aos doutos tenistas e partisse de volta à sua casa, o Doutor Sofrenildo sentiu um rápido tremor corporal. E - decepção - logo percebeu que estivera sonhando, em sua própria casa, na urbe congestionada. Então levantou-se, tomou um banho relâmpago, vestiu-se. A esposa (Dona Sofrência) serviu-lhe um breakfast rápido, e ele partiu em direção ao Foro de sua cidade. Estava esperançoso de que seus alvarás tivessem sido assinados.

Na chegada, viu na porta (fechada) do prédio, um aviso em letras garrafais: "Antecipamos em um dia a vigência do recesso. Volte em 1º de fevereiro de 2022".

Enfartado, o Doutor Sofrenildo sucumbiu ali mesmo. O médico legista chamado pela OAB atestou: "Morreu de tristeza e decepção".

E Shangri-la - com seus penduricalhos - continua sendo a realidade de um novo mundo possível. Extraoficialmente.

Fomos alcançados!

O custo de vida aumentou para 73% dos brasileiros no período de seis meses, que vai de maio e novembro, segundo pesquisa da Ipsos, feita em 30 países, entre 19 de novembro e 3 de janeiro. O Brasil é o quarto colocado em ranking de percepção da inflação, mesmo índice de Polônia e África do Sul. A Argentina lidera o ranking: 79%.

O levantamento também constatou que o transporte é o vilão do orçamento dos brasileiros. Para 80% dos entrevistados, os custos com deslocamento foram muito mais altos que há seis meses. Os gastos com alimentação e serviços (água, luz, gás, telefone, internet) também foram mais altos do que seis meses antes. A pesquisa entrevistou 20.500 adultos, com idades entre 18 e 74 anos, de 30 países, sendo mil no Brasil. Foi feita entre 19 de novembro e 3 de dezembro de 2021, por meio online. A margem de erro para o Brasil é de 3,5 pontos percentuais.

Caráter remuneratório

A conversão de licença-prêmio em dinheiro inclui verba de auxílio-alimentação e a base de cálculo para a conversão em pecúnia deve ser a última remuneração percebida pelo servidor, devidamente excluída as verbas de natureza transitória. Com esse entendimento, a 1ª Turma Recursal dos Juizados Especiais do Distrito Federal desproveu recurso do governo distrital contra sentença que obrigou a incluir no cálculo da licença-prêmio verbas remuneratórias como o auxílio-alimentação.

O autor da ação adquiriu o direito de usufruir de dez meses de licença-prêmio. Como não exerceu esse direito em atividade, obteve a conversão em dinheiro no momento de sua aposentadoria. Está criado o precedente (Processo nº 0728902-67.2021.8.07.0016).

Em alta

A desembargadora Salise Monteiro Sanchotene, do TRF da 4ª Região, teve aprovada pelo Senado Federal a indicação para compor o Conselho Nacional de Justiça no biênio 2021-2023. A indicação já foi comunicada à Presidência da República, que deve fazer a nomeação.

De acordo com o artigo 103-B da Constituição Federal, compete ao STJ indicar um juiz de TRF e um juiz federal para os quadros do CNJ. Os nomes são submetidos ao Senado. Aprovadas as indicações, a nomeação dos novos membros dos Conselhos é feita pelo presidente da República. risos. E o arremate presidencial foi com palavrões sequenciados ditos inteiros: "P-q-p! É f...".

Vínculo com o Uber

Dois dos três ministros que compõem a 3ª turma do TST entendem que deve ser reconhecido o vínculo de emprego entre motoristas e aplicativos de transporte, como Uber, 99 e Cabify. O julgamento teve início em dezembro de 2020 e foi retomado na quarta-feira (15). Até o momento, votaram o relator, ministro Maurício Godinho Delgado, pelo reconhecimento de vínculo: "É clara a subordinação desses trabalhadores". O ministro Alberto Bresciani acompanhou o voto. Em seguida, o ministro Alexandre Agra Belmonte prorrogou a vista, e o julgamento foi novamente suspenso.

Considerando que já há maioria (dois votos), e que essa foi a última sessão do ministro Bresciani (sua aposentadoria está marcada para o próximo dia 22) é muito provável que estejamos diante de novo precedente, no sentido do reconhecimento de vínculo. (Proc. nº 100353-02.2017.5.01.0066).

Vídeo sem censura

É livre a expressão da atividade intelectual, artística, científica e de comunicação, independentemente de censura ou licença. Com fundamento no artigo 5º da Constituição, o juiz Luiz Gustavo Esteves, da 11ª Vara Cível de São Paulo (SP) negou pedido da Associação Centro Dom Bosco de Fé e Cultura para impedir o especial de Natal deste ano do grupo humorístico Porta dos Fundos.

O vídeo apresenta uma sátira sobre a adolescência de Jesus Cristo. Em 2020, o especial de Natal da Porta dos Fundos também foi objeto de controvérsia judicial e chegou até o Supremo. Na ocasião, a 2ª Turma do STF manteve no ar a veiculação do especial no serviço de streaming Netflix. (Proc. nº 1136234-31.2021.8.26.0100).

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