03 DE JANEIRO DE 2022
OPINIÃO DA RBS
EM BUSCA DE CONSENSOS
Virou regra no Brasil, nos últimos anos, chegar a dezembro com uma sensação de desapontamento em relação ao comportamento da economia. Frustrações passaram a ser quase um padrão. O país enfileira uma sequência amarga de recessões e exercícios com baixíssimo crescimento do PIB. O legado deixado é o empobrecimento da população, percebido nas esquinas e confirmado nas estatísticas oficiais.
Os meses à frente prometem alta tensão devido à disputa pela Presidência da República. Mantido o atual clima de polarização política exacerbada, fraturando ainda mais a sociedade, não é possível esperar nada muito melhor do que o cenário cansativamente vivido pelos brasileiros no passado recente: atividade trôpega, recuperação lenta do mercado de trabalho, renda em queda, reformas basilares paradas e estresse social crescente. Os atuais prognósticos para 2022 são de estagnação.
Cabe às forças políticas responsáveis e à sociedade sinalizar que basta de ódio destrutivo. Não haverá ganhadores com a continuidade da marcha de rancores. É até possível vencer uma eleição alimentando a discórdia, mas a continuação do clima de hostilidades condena o país à divisão persistente e a um medíocre desempenho econômico. Sem consensos mínimos, não há como avançar. A incapacidade atual de dialogar mina não apenas as chances de desenvolvimento do país. Permeada nas relações cotidianas, a beligerância afeta famílias e vínculos de amizade. O Brasil está mentalmente adoecido.
Chegou a hora de as lideranças que dizem querer o melhor para o país demonstrarem, na prática, este sentimento. E ele deve ser comprovado com palavras e gestos que indiquem a volta do convívio minimamente respeitoso e da tolerância entre quem pensa diferente. É preciso dar o exemplo, para que ele se irradie e influencie o comportamento de cada cidadão. Instabilidade política e institucional não é apenas uma ideia abstrata. Se materializa na forma de inflação, moeda depreciada e economia débil. Perdem todos, inclusive o ganhador das eleições.
As bases para um desenvolvimento mais duradouro e robusto, por outro lado, estão na estabilidade. Isso não significa inexistência de disputa política ou pelo poder, com direito a críticas contundentes. Mas quer dizer conhecer os limites da civilidade e respeitar a Constituição, a independência dos poderes, a democracia, o direito à vida e à liberdade em seu conceito mais amplo, que só encontra barreira quando a autodeterminação de outro pode ser prejudicada. São valores que precisam ser reafirmados.
O ano é novo, mas os desafios são velhos. O país clama por reformas como a tributária e a administrativa. Privatizações prometidas precisam deslanchar. Um salto na educação e na produtividade é urgente. O Brasil necessita cuidar melhor do ambiente. Não é um ônus, mas um valioso ativo econômico para o futuro. Não é mais tolerável continuar a perder posições na corrida global da ciência e da tecnologia. Empreendedorismo e investimentos privados precisam ser estimulados. Orçamentos públicos devem ser direcionados para os interesses da maioria, e não para o proveito de pequenos grupos. A credibilidade fiscal tem de ser recuperada.
Mas muito pouco disso será factível sem uma conciliação política e social que permita o avanço desta agenda de restauração da confiança conhecida, mas travada. Com a belicosidade hoje vigente, qualquer plano de governo, por mais racional e brilhante que pareça, corre o risco de fracassar. Está no serenar de ânimos a chave que pode abrir porta para o crescimento e para a busca por um maior bem-estar da população - o verdadeiro sentido da existência de uma nação. O ano que começa, uma espécie de encruzilhada, marca ainda o bicentenário da Independência do Brasil. Até o caráter simbólico surge como uma oportunidade de libertação das amarras que impedem o progresso nacional.
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