domingo, 31 de janeiro de 2021


30 DE JANEIRO DE 2021
MARCELO RECH

Populismo em ação 

Dilma Rousseff e Jair Bolsonaro não poderiam ser mais antagônicos. Mas há uma inusitada inversão de sinais entre ambos quando a voz estatizante da deputada federal Jandira Feghalli (PCdoB-RJ) vibra com a demissão do presidente da Eletrobrás, Wilson Ferreira Junior, enquanto o campeão do liberalismo e ex-secretário de Desestatização Salim Mattar joga a toalha e desabafa: "Venceu o establishment".

A murchada no balão da privatização da Eletrobrás ceifa mais um tanto das esperanças dos derradeiros crentes no conto da versão liberal de Bolsonaro. Dilma comeu fogo de sua base enfurecida quando, ao assumir o segundo mandato, em 2015, nomeou o liberal Joaquim Levy para o Ministério da Fazenda, aprovou cortes em benesses previdenciárias e trabalhistas e deu curso a um programa de concessões à iniciativa privada de estradas, ferrovias e aeroportos.

Bolsonaro recebeu muitos votos de eleitores inconformados com um Estado mastodôntico e cruelmente ineficaz. Mas só deixa perplexos os que desprezavam a trajetória do ex-capitão, eleito deputado federal por sete vezes na condição de líder sindical informal de militares e policiais. Na Presidência, ninguém pode acusar Bolsonaro de trair seu passado. Como parlamentar, Bolsonaro votou sistematicamente a favor de mais gastos e contra cortes públicos. Ele realmente crê no papel central do Estado acima de tudo. Entre decisões duras mas necessárias, como enxugar o Banco do Brasil e prepará-lo para a concorrência, ou ceder ao populismo fácil, opta inexoravelmente pela última alternativa. Jandira Feghali tem razão em ficar aliviada.

Na campanha de 2014, Dilma vendeu a noção de que as contas estavam sólidas e que o Brasil caminhava para um novo ciclo de desenvolvimento. Abertas as urnas, a miragem se evanesceu, deixando no lugar a contabilidade criativa, a alta da inflação e dos juros e uma das recessões mais fundas da história recente. Por isso, foi acusada de estelionato eleitoral. Bolsonaro não faz melhor. Além de manter a máquina intacta, lançou o anzol da vaidade e ambição e retirou do posto o juiz que simbolizava o combate à corrupção para depois espicaçar sua imagem. E, valendo-se de Paulo Guedes, fez aparentar que o Brasil arquivaria as "criaturas do pântano" e rejuvenesceria com a lipoaspiração do Estado obeso.

Em dois anos de governo, Bolsonaro desviou-se da estrada liberal, apaixonou-se pela distribuição de dinheiro público, esqueceu o compromisso de emagrecer o Estado e, sem surpresa, deixou-se enlevar, como todos os seus antecessores, pelos braços largos e providenciais do centrão. Como Collor e Dilma já demonstraram, presidentes caem por diferentes razões, mas o ingrediente comum nos impeachments é o descalabro econômico. Bolsonaro teria algo a aprender com eles.

MARCELO RECH

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