CAOS AMAZÔNICO
Primeira capital brasileira a enfrentar a falta de UTIs no ano passado, Manaus vive agora o drama de uma segunda e devastadora onda da pandemia. Em apenas 12 dias de janeiro, a cidade chegou a 2.228 internações por covid-19, superando o triste recorde de abril do ano passado - 2.128. Foi nessa época que as imagens de valas sendo abertas para receber os mortos chocaram o mundo. Passados nove meses, o microcosmo da capital amazônica reflete a falta de planejamento, o descuido com a vida e as desigualdades que se transformaram, infelizmente, em marca do Brasil.
Foi preciso que a situação chegasse ao caos, com mais de 300 pessoas esperando leitos na rede hospitalar, para que um movimento mais consistente e articulado fosse deflagrado. O Exército, em atitude louvável, transportou 350 cilindros de oxigênio para Manaus, uma tentativa de poupar vidas ameaçadas pela inércia e pelo negacionismo. O ministro da Saúde, Eduardo Pazuello, foi enviado às pressas para a cidade, onde fez promessas vagas de ajuda, que já deveria ter chegado muitos antes dos inconsistentes "dia D e hora H".
Já o novo prefeito, empossado a menos de duas semanas, está tentando enfrentar a situação. Prometeu que as cenas de valas comuns sendo abertas não se repetirão. Para tanto, David Almeida providenciou câmaras frigoríficas para armazenar cadáveres. Enquanto os amazonenses sofrem, o presidente da República, Jair Bolsonaro, veio a público afirmar que a culpa pelas mortes é da falta de tratamento precoce, enquanto a razão e o bom senso indicam que a forma mais eficiente de evitar a doença é não se expor a ela.
De fato, é inadmissível que tão pouco tenha sido feito desde o ano passado, quando o cenário que agora se concretiza já tinha contornos definidos. Entre os fatores que emolduram o colapso, se destaca o mau exemplo de homens públicos, eleitos e pagos pela população, que insistem em debochar e em minimizar a pandemia, estimulando, com isso, a falta de cuidados que salvam vidas.
A capital do Amazonas fica a 3,1 mil quilômetros de Porto Alegre, uma cidade bem mais estruturada em termos de resposta aos desafios impostos pelo novo coronavírus. Mas o que acontece lá e em outras regiões do país nos serve de alerta e de inspiração para a solidariedade e para a ação. Um país que preze a dignidade dos seus cidadãos não pode considerar mais de 200 mil mortes como algo natural, muito menos sucumbir ao efeito anestésico das notícias falsas e da negação da ciência.
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