
As guerras e a bola
Leio que alemães e norte-irlandeses concluíram recentemente uma disputa de futebol adiada por 65 anos por causa da Guerra Fria. O jogo entre o Glenavon FC, da Irlanda do Norte, e FC Erzebirge Aue, da Alemanha (na era comunista conhecido como Wismut Karl-Marx Stadt), foi realizado como amistoso em Lurgan, a 40 quilômetros de Belfast, com o estádio lotado por torcedores dos dois países, entre os quais ex-atletas que, à época, não puderam jogar a partida oficial pela Copa dos Campeões da Europa por terem sido impedidos de atravessar a chamada Cortina de Ferro, divisão ideológica da Europa depois da Segunda Guerra Mundial.
Ganharam os alemães, mas isso é o que menos importa. O importante é o sentido simbólico da disputa esportiva que, embora tardiamente, acabou se sobrepondo ao antagonismo político e ao belicismo. As notícias sobre o jogo dão conta de que os torcedores dos dois países celebraram juntos depois da partida - como certamente gostariam de fazer outros povos envolvidos em guerras impostas por governantes prepotentes e sedentos de poder.
Como dizem os comerciais da Fifa, se o futebol fosse um país seria a maior nação do mundo, com um idioma comum a todos os seres do planeta, regras claras e disputas pacíficas - ainda que de vez em quando o fanatismo clubístico ou nacionalista derive para beligerância. Mas são conflitos pontuais, que só raramente resultam em agressões físicas e perdas de vidas.
Já a guerra é sempre um jogo fatal em que todos perdem, dos militares obrigados a lutar aos civis vitimados pelos bombardeios. Não há maior expressão da estupidez humana do que um conflito bélico. Armas simbolizam a falência do diálogo e da inteligência humana. O VAR da História sempre confirma isso.
Claro que o futebol, embora tenha o poder de unir pessoas de diferentes tendências, de emocionar e proporcionar espetáculos encantadores, também tem as suas deformações - que vão dos episódios de violência entre torcedores rivais às manifestações de racismo. Mas, no esporte, tudo pode ser resolvido sem ódios e morticínios. Mesmo que leve 65 anos. _
O conteúdo desta coluna reflete a opinião do autor
NILSON SOUZA
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