06 de maio de 2016 | N° 18518
DAVID COIMBRA
Homens de muita fé
Em política, sou a favor de ser contra, contra ser a favor.
Com o que não digo que todo político seja mau por natureza. Um político não é diferente de um jornalista que mora num loft em Manhattan, de um gari que varre a Assis Brasil às seis da manhã ou de um pajé de uma tribo do interior do Acre. O conjunto da espécie humana tem, basicamente, as mesmas necessidades e sentimentos.
A diferença é a atividade. O político precisa ser mais vigiado porque ele exerce mais poder. Não me refiro apenas à influência, e sim ao poder concreto, que pode mudar a vida das outras pessoas. O político, dependendo do cargo que ocupa, tem essa possibilidade. E o importante é saber que, quanto maior o poder, maiores serão as tentações.
Logo, a postura correta da sociedade é desconfiar dos políticos, de todos os políticos, e tentar, sempre, diminuir-lhes o poder. O poder tem de ser dividido, compartilhado e exercido de forma cruzada por instâncias diferentes. Esse é o princípio que Montesquieu usou para teorizar a respeito do equilíbrio de pesos e contrapesos alcançado pela ação conjunta de Executivo, Legislativo e Judiciário.
O maior de todos os defeitos da nossa democracia é a crença de que o Executivo é capaz de, com boa vontade, resolver os problemas do país. Trata-se de crença mesmo, matéria de fé, e a fé, como dizia Mencken, é a crença ilógica na ocorrência do improvável.
Hoje, o que sobrou dos petistas se sustenta com a fé. Houve muitas críticas ao voto dos deputados, na sessão que analisou o impeachment, quando eles faziam dedicatórias a Deus ou à família. Ou seja: não seria um voto racional. Seria afetivo e motivado pela fé. Os votos governistas, no entanto, também foram afetivos e motivados pela fé. E o pior: não era fé em um ente superior, mas em homens falíveis, como todos os homens: Marighella, Che Guevara, Brizola, por aí vai. É que os intelectuais de esquerda que ainda se batem pelo governo acreditam realmente que um partido, no caso o PT, ou um homem, no caso Lula, podem ser os defensores dos pobres e os salvadores da pátria.
Pegue Chico Buarque, talvez o maior artista brasileiro de todos os tempos. Ele tem fé nas esquerdas, no PT e no Lula, ele acredita, mesmo, que um grupo de homens, no Executivo, possa fazer “O Bem” para o país. Ele não pensa isso por interesse. Nem por má intenção. É crença. É exatamente igual ao pastor que vota em nome de Jesus.
Mas não é assim que funciona. Nunca funcionou. Em nenhum país do mundo, em tempo algum, houve um homem ou um partido que tivessem tornado justa uma sociedade que antes era injusta. Note: isso jamais aconteceu. JAMAIS.
Por que um homem letrado como Chico Buarque acreditaria que isso seria possível no Brasil?
Porque ele é movido pela fé.
A defesa de um governo que, está provado, beneficiou-se de corrupção em vários níveis (e que, para arrematar, é extremamente incompetente) é irracional, emotiva e, até por isso, quase comovente.
À parte as manifestações de ódio de quem se opõe a esse governo, o que também é irracional, o processo que vem ocorrendo no Brasil é muito saudável. É a Justiça, o Ministério Público e a Polícia Federal, são as instituições brasileiras que, de baixo para cima, estão corrigindo o país.
A punição de todos os que cometeram crimes, por si, traz mudança, cria parâmetros. Mas, depois disso, é importante reduzir o poder do governo federal. Não só porque o governo federal não é capaz de, sozinho, resolver todas as questões. Mas para que as tentações sejam reduzidas também.
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