26 de maio de 2016 | N° 18535
L. F. VERISSIMO
Mouro
Compraram um cachorro para cuidar da casa. Depois de tantos roubos e arrombamentos, depois de tantos ataques ao seu patrimônio, a família decidiu que só um cachorro resolveria. Mas um cachorro de verdade, treinado para pegar ladrões, não apenas espantá-los. Nada parecido com um cachorrinho antigo da família, chamado Frufru, um inútill que morrera de susto ao ver um gato.
Mouro – deram-lhe o nome de Mouro por causa da sua assustadora cor preta – era um cachorro especial. Quando entrava alguém na casa, ele corria para cheirar o recém-chegado. Isto causou o primeiro problema com Mouro na casa. Um dia, a filha chegou com um namorado, e o cachorro, depois de cheirá-lo, derrubou-o no chão e sentou em cima do seu peito, como se esperasse a chegada de reforços para dominá-lo. Descobriram depois que o namorado carregava maconha no bolso. O namorado foi aconselhado a nunca mais aparecer na casa e foi corrido para a rua pelo Mouro, sob protestos da filha.
Mouro não dormia. Passava a noite rondando pelo jardim da casa ou dentro da própria casa. Mais de uma vez, quando levantava no meio da noite para fazer xixi, o dono da casa quase tropeçara no cachorro, cuja cor preta o tornava invisível no escuro. E a dona da casa se queixava dos sustos que levava, cada vez que o cachorro entrava, silenciosamente.
– Esse cachorro está começando a atrapalhar a nossa vida – disse a mulher.
– Você está maluca? – disse o marido. – O Mouro é formidável. Apareceu algum ladrão por aqui depois que ele chegou? Nenhum.
– E o que o Mouro fez com o meu primo Artur, expulsando-o da nossa casa e correndo atrás dele pela rua?
– É. Mas depois se soube que o Artur está envolvido num negócio de propina. Ele deve ter farejado alguma coisa.
– Mas ele é que está mandando na nossa casa?
– Não exagera.
– Qualquer dia, ele cheira você e descobre aquele seu rolo com a Receita...
– Você acha?
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