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quarta-feira, 2 de novembro de 2011
02 de novembro de 2011 | N° 16874
MARTHA MEDEIROS
Quarto
Estamos em plena vigência da Feira do Livro e aproveito para fazer uma recomendação de leitura, já que ainda estou sob o efeito do prazer de tê-lo tido em mãos. Chama-se Quarto, da irlandesa (hoje residente no Canadá) Emma Donoghue.
Vou contar do que se trata, e vai parecer que estou estragando o prazer da descoberta, mas não é nada que já não esteja revelado na contracapa: a história é narrada por um garotinho de cinco anos que vive enclausurado com a mãe num quarto. Ele nasceu lá dentro e nunca saiu pra fora. Nunca.
Seu universo está concentrado entre as quatro paredes daquele cubículo, que a mãe se esforça para transformar num espaço lúdico e estimulante – o que, espantosamente, consegue, apesar da tragédia de estar sequestrada há sete anos.
Quando eu soube do enredo, vi algumas semelhanças com o filme A Vida é Bela, em que o personagem do ator Roberto Benigni faz o possível para que seu filho não perceba que estão trancafiados num campo de concentração.
Mas Quarto vai muito além dessa atitude de amor extremo que faz com que queiramos proteger nossos filhos da violência emocional, nem que para isso seja preciso ocultar-lhes a verdade. O livro confirma a tese de que nada é mais universal que o nosso umbigo e que uma história confinada em si mesma (e põe confinada nisso) traduz a humanidade toda.
Em geral, acho chato ler obras narradas por crianças, salvo algumas exceções. Essa é uma exceção com honra ao mérito. Jack, o garoto preso com a mãe, tem uma inocência que não é apenas terna, mas também inteligente. Através de seu olhar absolutamente inédito para tudo que conhece (e esse tudo é tão pouco), passamos a enxergar as coisas como elas de fato são, sem os condicionamentos a que nos acostumamos.
Não deixa de ser uma narrativa de horror e suspense, mas com profundo teor psicológico – felizmente, sem didatismo ou qualquer pretensão. Inclusive, a certa altura do livro, há um trecho em que a autora debocha das tentativas de se intelectualizar tudo o que acontece e de interpretações pseudofilosóficas que mais complicam do que explicam. Diante de um sabe-tudo exibicionista, um dos personagens resmunga: “Esses sujeitos passam tempo demais na faculdade”.
Quarto é um livro simples, com diálogos espertos e verossímeis. Não requer nota de rodapé. De forma comovente sem ser piegas, apenas utiliza uma história original – beirando o surreal – para lembrar o que todos intimamente sabem: que o cativeiro (ou o útero, a ignorância, os costumes, as convenções, os preconceitos – escolha sua própria metáfora para confinamento) é, no fundo, estabilizante, e que nada é mais assustador do que a liberdade.
marthamedeiros@terra.com.br
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