Aqui voces encontrarão muitas figuras construídas em Fireworks, Flash MX, Swift 3D e outros aplicativos. Encontrarão, também, muitas crônicas de jornais diários, como as do Veríssimo, Martha Medeiros, Paulo Coelho, e de revistas semanais, como as da Veja, Isto É e Época. Espero que ele seja útil a você de alguma maneira, pois esta é uma das razões fundamentais dele existir.
sexta-feira, 4 de dezembro de 2009
04 de dezembro de 2009 | N° 16175
PAULO SANT’ANA | MOISÉS MENDES (INTERINO)
Bravura contra a gripe
Aí pela metade de agosto, saí a campo para tentar entender como as pessoas reagiam ao alarme provocado pela gripe A em Porto Alegre. Os hospitais haviam instalado barracas para atender quem estivesse com os sintomas da gripe, como se estivessem em guerra.
Fui até uma dessas barracas, no Hospital Mãe de Deus, e confesso agora: dei um passo, dei mais um e parei no terceiro. Não entrei nas salas de espera. Fiquei no que seria a portaria.
Espiei do balcão para dentro daquela sala de lonas brancas, onde pessoas sentavam-se longe umas das outras, entreolhando-se por detrás das máscaras que recebiam na entrada. Fui sufocado pela sensação de que o ar era denso demais para um asmático. Recuei.
As barracas eram um cenário de filme de ficção científica montado perto demais de todos nós. Só conversei com pacientes que saíam ou entravam. Tinha espiado o cenário.
Tinha a clara percepção de como aquilo tocou em todas as minhas fragilidades e guardei o que me sobrava de atrevimento para outra empreitada. Lembro do rosto tenso e da respiração ofegante de algumas pessoas com as quais conversei. Havia uma zona de sombra em torno dos olhos opacos de duas mulheres mascaradas. Não era necessariamente da gripe, até porque ainda estavam em busca de diagnóstico, mas certamente era do cansaço físico e do abatimento provocado pelo medo.
Conto isso agora porque recebi, com uma máscara amarrada em torno da capa, um livro que narra essa guerra. Foi editado pelo Hospital de Clínicas e chama-se Gripe A – Um hospital público e universitário na frente contra a influenza A-H1N1. É a história de gente que ficou dentro ou perto das barracas por três meses, de julho a setembro, quando o mundo tentava decifrar o tamanho da pandemia e suas consequências.
É uma das coisas mais bonitas e úteis já produzidas pelo setor público para contar seus feitos. É a história da mobilização de profissionais da saúde de todas as áreas, que se uniram para entender o que acontecia e, ao mesmo tempo, enquanto entendiam o que era possível, salvar quem pudesse ser salvo. Estão no livro todas as angústias, das miúdas às grandiosas. Como a indecisão sobre o melhor modelo de máscara. Ou o procedimento adequado para avaliar sintomas da própria equipe envolvida no mutirão.
Os medos que eu senti diante da sala de espera da barraca também estão ali, manifestados de outras formas, pelos que teimavam em afastá-los. Mas o livro, delicado e impessoal, é na essência – e esta é uma conclusão minha – um relato de competência, desprendimento e bravura, virtudes que se manifestam nas guerras mesmo, em hospitais de campanha, com o agravante de que no caso da gripe A o socorrido poderia contagiar quem estava ali para salvá-lo.
Mutirões como o do Clínicas repetiram-se em outros hospitais públicos e privados. O livro do Clínicas é, simbolicamente, também uma homenagem a todos os que se envolveram no combate à gripe A. Vale pelo que conta e pelo que não diz.
Não diz, mas pode ser lido nas entrelinhas, que o suporte de saúde pública no Brasil, atordoado por tantas bordoadas, é a maior expressão de democracia concreta, depois de uma eleição, assegurada pela Constituição de 1988. O livro do Clínicas é um jeito de se enxergar, pelas sensações de quem estava lá dentro, muito além das frestas daquelas barracas.
Amanhã, vamos esclarecer o sumiço dos tico-ticos de Porto Alegre. A culpa não é do chupim.
Assinar:
Postar comentários (Atom)
Nenhum comentário:
Postar um comentário