segunda-feira, 17 de setembro de 2007

O espetáculo deve continuar


ALBA ZALUAR

O espetáculo deve continuar

A GLOBALIZAÇÃO tem tido efeitos paradoxais. De um lado, a concentração econômico-financeira dilui a autonomia das empresas nacionais e a importância do Estado-nação.

De outro, uma rede de informações célere e eficiente permite novas e rápidas formas de comunicação entre pessoas em diferentes cidades, países, continentes ou de diversas idades, gêneros, preferências, religiões e estilos de vida.

Nos Estados-nações, cada vez mais dependentes de decisões tomadas fora deles, um processo inverso termina nas demandas de descentralização e na importância cada vez maior do local em que se mora.

Além disso, a rede de comunicação torna possível não só acompanhar os processos decisórios, transformando-os em um espetáculo assistido ao vivo e em cores no tempo real, como fazer julgamentos a respeito dos protagonistas e deles participar quando o processo é local.

A política espetacularizada desperta o que Roberto Romano chamou de "murmuração republicana" mais densa e mais extensa.
Acordos, conchavos, votações secretas estimulam a revolta do público impedido de acompanhar ou acompanhando os rituais políticos segundo os filtros da mídia.

Ruim para o público, ruim para os políticos protagonistas, péssimo para a transparência e a responsabilidade nas democracias consolidadas.

Tanto mais quando o resultado fere a capacidade de julgamento segundo evidências tornadas públicas. A promessa de mais democracia pela possibilidade de conhecer, saber, opinar e influir que se abriu com os novos canais de comunicação disponíveis e o desmembramento dos centros de decisão pode não se cumprir.

No caso da descentralização administrativa, como no acompanhamento dos rituais políticos, a democratização depende do desenho e da construção de instituições estáveis e permanentes.

Essas só terão continuidade se baseadas em relações de confiança, conseguidas pela transparência das ações e pela ética dos protagonistas. Instituições sólidas são construídas em torno de valores morais e códigos de ética aceitos porque discutidos e aprovados.

Aquele espaço entre o mercado e o Estado, denominado de sociedade civil, é muito amplo e conflitivo, composto de muitas forças sociais diferentes. Fascistas, racistas, organizações predatórias e criminosas também fazem parte dela.

A sociedade só merece o nome civil quando pratica a adesão ao Estado de Direito e à civilidade entre as pessoas que fazem parte das muitas associações que a compõem.

Os protagonistas do ritual das decisões políticas são responsáveis pela difusão do respeito às leis e às regras da civilidade.

ALBA ZALUAR escreve às segundas-feiras nesta coluna.

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