sábado, 29 de setembro de 2007



30 de setembro de 2007
N° 15382 - Moacyr Scliar


Moda & modelos

O que acontece com a emoção reprimida pelas modelos? Transforma-se em ansiedade

Moda é coisa importante. Vestir bem, com elegância e bom gosto, não é só questão de vaidade; é também fator de auto-estima e uma forma de assumir identidades.

Dize-me como te vestes e eu te direi de que grupo social fazes parte, punk, dark, patricinha. Daí a extraordinária expansão da indústria da moda.

E daí a ascensão das modelos profissionais, coisa que para muitas jovens está sendo uma escolha de vida. Uma garota do Interior pode se transformar numa supermodelo e ganhar muito mais do que ganharia se fosse médica ou professora.

Profissão interessante, essa. Predominantemente feminina; os modelos masculinos parecem um tanto deslocados, quando não contrafeitos, nos desfiles.

A passarela é território das mulheres. Belíssimas, o que corresponde a uma tendência geral. Provavelmente nunca, na história da humanidade, as mulheres foram tão belas (e as brasileiras disso são um exemplo).

Há modelos famosas, que ganham muito dinheiro. Este êxito incendeia a imaginação das garotinhas que olham, deslumbradas, as vencedoras, aquelas que a TV e as revistas mostram sempre. Agora: ser modelo não é fácil. É uma profissão exercida de acordo com uma estrita e rigorosa rotina.

As modelos desfilam todas do mesmo jeito; foram treinadas para isso. Em primeiro lugar, adotam aquele estranho jeito de caminhar, que as torna semelhantes a aves pernaltas. Mais interessante, e perturbadora, é a expressão facial. Modelos, por definição, são impassíveis.

Não sorriem, não olham para ninguém, muito menos abanam para conhecidos ou familiares - o olhar é vago, perdido no horizonte, como se estivessem em outra dimensão (e provavelmente estão em outra dimensão).

Mostrar emoções? De jeito nenhum. A passarela não é o palco, a modelo não é atriz, não é cantora.

Aparentemente não está minimamente interessada naquelas pessoas que, lá de baixo, a observam, às vezes com admiração, às vezes até com inveja. Esta impassibilidade chama a atenção; contrasta com a expressão dos manequins, ao menos dos antigos manequins das vitrines.

Estes sempre sorriam; um sorriso fixo, imutável, meio sinistro até (não raro manequins figuravam em filmes de terror). Mas os manequins sorriem; as manecas (será que ainda se usa este termo?) não sorriem.

São figuras meio robóticas, que executam maquinalmente seu trajeto. Só no final do desfile é que aparecem, batendo palmas (maquinalmente).

Pergunta: o que acontece com esta emoção que não é expressa, que é reprimida? Provavelmente transforma-se em ansiedade.

Ansiedade quanto ao desempenho, ansiedade quanto ao futuro, algo que caracteriza as ocupações de duração fugaz, ligadas à juventude, ao vigor atlético, à conformação física.

Será que estou engordando, é uma dúvida que deve ocorrer a muitas modelos, no desfile, fora do desfile, nos pesadelos. A resposta sabemos qual é: a anorexia nervosa.

Que já está se transformando em preocupação generalizada. Ainda recentemente uma modelo foi barrada em Londres, não por excesso de peso, mas por falta de peso. Ou seja: os organizadores de desfiles não querem ser acusados pela doença das modelos.

É a outra face da moda, esta. A face que as modelos, por boas razões, evitam mirar. Talvez isso explique por que uma modelo jamais olha para as pessoas que vão ao desfile.

Ela não quer ver, de pé no fundo do salão, uma garotinha a olhá-la deslumbrada. A garotinha que um dia foi e cujos sonhos gostaria de recuperar.

Falando em modelos, em Jogo de Damas, editado pela modelar, sempre exemplar e nunca alvar L&PM, David Coimbra faz uma saborosa incursão pela História em busca de grandes mulheres. E as encontra!

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