30 DE MARÇO DE 2021
NÍLSON SOUZA
O ano da neve
Para cumprir um compromisso profissional, estou pesquisando sobre acontecimentos do ano de 1984, eternizado pelo célebre romance do britânico George Orwell que revelou o Big Brother para o mundo. Não me refiro ao polêmico programa televisivo que agora, mais do que nunca, imita a realidade: pessoas confinadas em casa, ansiosas, estressadas, cada uma querendo mandar as outras para o paredão. O BB do livro, como sabemos, é ainda mais perverso. Simboliza um governo despótico, que usa a tecnologia para vigiar, controlar e oprimir a população.
Não é sobre isso que estou pesquisando. Busco fatos reais. De memória, me recordo que 1984 foi o ano em que nevou em Porto Alegre - e eu não vi, porque estava em São Borja, na cobertura jornalística da visita de Tancredo Neves ao túmulo de Getúlio Vargas. Era muuuuito frio naquele agosto, mas as únicas "neves" que apareceram por lá estavam no sobrenome do visitante. Tancredo me lembra também que 1984 foi o ano das Diretas Já e da frustração daquele coro que se ouvia nas ruas e praças do país: "Um, dois, três; quatro, cinco mil: queremos eleger o presidente do Brasil".
Ficou para bem mais tarde e, sinceramente, parece que ainda não aprendemos a fazer boas escolhas.
Mas deixemos o clima e a política de lado. Apenas quero relatar nesta crônica as minhas agruras para consultar jornais da época com arquivos e hemerotecas fechados por causa da pandemia. Estou constatando que, infelizmente, os registros digitais são escassos, pouco acessíveis e inconfiáveis. Começo a pensar que os pesquisadores do futuro vão lamentar para sempre a morte dos impressos.
É sabido que na era da informação instantânea o jornal de papel já nasce desatualizado, pois a internet, o rádio e a televisão sempre chegam antes. Mas quando alguém precisa saber o que exatamente aconteceu no chamado antigamente, ou mesmo logo ali, em 1984, pode ficar dias rolando telas que dificilmente vai encontrar registros precisos e detalhados. Não é saudosismo, é constatação.
Se os arquivos dos jornais locais ou o Museu Hipólito José da Costa não abrirem suas portas logo, acho que também sentirei ganas de mandar alguém para o paredão.
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