sábado, 27 de fevereiro de 2021


27 DE FEVEREIRO DE 2021
FLAVIO TAVARES

O CAOS NO CAOS

A pandemia transformou o mundo numa ilha cercada de caos por todos os lados. E, nela, nós, humanos, a cada dia temos menos terra firme. A continuar assim, em meses ou anos, não teremos onde pisar. Escrevo "anos" porque nada sabemos sobre o fim da peste, tal qual quase nada sabemos do seu início.

O aumento dos casos de covid-19 em Porto Alegre e em todo o Estado (ou pelo país inteiro) é aterrador por não existir solução a curto prazo. O contágio se alastra e cada um de nós deve agir, não só o poder público. O governador e os prefeitos podem servir de modelo a copiar ou evitar, mas - além da vacina - o cuidado maior está em nossos pequenos gestos, como usar máscaras, lavar as mãos e nunca aglomerar-se.

Basta já a desmobilização da sociedade provocada pelo presidente da República e seu ministro da Saúde, que desdenharam a peste e jamais a enfrentaram. Em vez de nos dividirem na errática burocracia das cores, governador e prefeitos devem evitar que se repita, aqui, o horror de Manaus, onde se aguardava a morte de algum infectado para outro doente ocupar seu lugar num leito de UTI, tentando sobreviver.

Toda morte é brutal, mas, quando alguém próximo nos deixa, a dor se transforma em abismo. Assim me senti com a morte de Ludwig Buckup, um dos nossos raros cientistas verdadeiros, dedicado à zoologia e à botânica e aguerrido protetor do bioma pampa e da natureza. Fomos contemporâneos no curso de Biologia da UFRGS, que não concluí, mas onde conheci sua dedicação à ciência. Agora, a covid-19 o matou, mostrando que o contágio é um assassino que nos espreita em qualquer lugar.

A grande tarefa é evitar que o caos engendre ainda mais caos e crie pânico.

O caos maior, porém, é não perceber o caos ou fantasiá-lo de "inocente" para estendê-lo à administração pública. Ou - indago - não é isto que Jair Bolsonaro anuncia ao prometer atenuar o rigor da lei de improbidade administrativa que, hoje, leva à prisão funcionários corruptos?

O presidente da República alega que a lei atual inibe a atividade dos prefeitos, como se a improbidade ou o roubo encoberto fossem virtudes, nunca um malefício em si.

As grotescas ideias que o deputado bolsonarista Daniel Silveira vomitou pelas tais "redes sociais" mostram a estupidez do caos dominando a política. Mas, em vez de tentar extirpá-la, a Câmara dos Deputados quer mudar a Constituição para impedir que os parlamentares possam ser presos pelo Supremo Tribunal, como agora ocorreu.

Não é o caos no caos?

Jornalista e escritor - FLÁVIO TAVARES

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