13 DE FEVEREIRO DE 2021
MONJA COEN
NÃO FIQUEM SE ACHANDO SUPERIORES A NINGUÉM
Era uma vez um idoso que se deitou para morrer. Estava com dores e mesmo assim, vendo tanta gente chegar, resolver deixar de herança seus ensinamentos finais.
Imagine você morrendo e o povo esperando suas palavras. Com dor e desconforto, não dá para fazer piadas, enrolar, ficar falando blablablá.
O senhorzinho foi direto ao ponto daqueles que se lamentavam e disse:
- Não se lamentem. Tudo que começa termina. Não é meu corpo que vocês amam, mas meus ensinamentos, meus truques, meus conselhos, minha ternura.
Seus truques eram seus meios hábeis de fazer todos despertos. Há gente que vive dormindo, nem percebe o tempo indo e de repente se vê de face com o fim. Quer retroceder, mas não dá.
Esse idoso era um professor e, com certa dificuldade, foi continuando a ensinar: que fossem honestos e éticos, que mantivessem a linha e a dignidade, que não caíssem em tentação - há tantas e disfarçadas que a pessoa não se dá conta e cai numa vala na estrada. Mas quem consegue estar presente, atento e resistente vive no mundo como uma tocha acesa no meio da escuridão.
Falou ainda que deveriam estar sempre perto uns dos outros, dando apoio, compartilhando e colaborando para que a lei verdadeira jamais se perdesse e que todos pudessem ser muito ativos na transformação da ignorância em sabedoria. Tarefa - não tarefa, pois no fundo não haveria nada a ensinar, ninguém a aprender, pois nada tem uma autoidentidade substancial fixa e permanente.
Logo, não fiquem se achando superiores a ninguém. Nem pensem que são dotados de estilo, inteligência acima das outras gentes. Tomem cuidado para não se perderem, se confundirem, serem provocados pelos apegos e aversões, desejos e aflições. Há um caminho de liberdade, e esse é o da verdade. Procurem estar sempre em boa companhia e saibam que a melhor de todas é sempre a sua mesma, sozinho.
Ele falava da grandiosidade do isolamento. Do prazer de estar a sós, de sentar em noite quente, olhar a lua e as estrelas, reconhecer o silêncio mesclado de todos os sons. Saber-se interligado a todas as galáxias e que nunca, nunca, nunca está só.
Ele falou bonito, de comover, de chorar. Estava cercado por todos os bichinhos, de elefante a besourinhos, de seres celestiais e terráqueos. Esse senhor de 80 anos não ficou na fila para a vacinação. Naquela época, não havia. Nem coronavírus nem pandemia.
Foi morrendo devagarinho. Inspirando e expirando em plena atenção. Que fossem justos e dignos, respeitando a cada irmão.
Reconhecendo nas mulheres suas mães, irmãs e amadas para serem sempre dignificadas, honradas, acolhidas e reconhecidas como grandes parceiras, que todos podem manter a mente da equidade, mente desperta.
Depois silenciou. Tudo silenciou. Contam que foi cremado e suas cinzas espalhadas pelos reinos mais sagrados.
Até hoje nos lembramos. Seria em 15 de fevereiro o dia de sua despedida dos amigos, das amigas, dos irmãos e das irmãs. Entrou parinirvana - a grande tranquilidade. Capaz de controlar a si mesmo na vida e no morrer. Deixou muitos sucessores e sucessoras - a mim, me honra ser uma herdeira.
Sou de Buda uma filha, amiga, discípula e parceira. Transmitir seus ensinamentos, viver como ele viveu, seguir assim os preceitos é ser quem sou, mesmo sem perceber que quem escreve não é nem deixa de ser alguém.
Mãos em prece.
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