05 de maio de 2016 | N° 18517
DAVID COIMBRA
Uma história de amor
Pois pedi. E Sônia me liberou para contar a história com nomes e sobrenomes por inteiro, mas, pensando bem, melhor não. Há outros envolvidos que talvez não gostem de ser identificados, então vou revelar-lhes apenas os prenomes.
Deu-se na Liverpool do Rio Grande: o IAPI. Sônia teve a sorte de para lá se mudar quando estreava nos tempos hormonais da adolescência. Em poucos meses, conheceu um guapo vizinho chamado Alfredo, e por ele se apaixonou. Apaixonaram-se, na verdade, que Sônia era correspondida.
O namoro, com seus altos e baixos, mais altos do que baixos, estendeu-se por 10 anos.
Neste ponto, estamos em 1976. Geisel era o presidente da República, o Inter seria bicampeão brasileiro com o maior time da sua história e, na Irlanda, a banda U2 começava a ser montada. Não existia internet nem telefone celular. A maioria dos moradores do IAPI não contava nem com telefone fixo em casa, e nessa categoria se enquadravam Sônia, Alfredo e o degas aqui.
Foi exatamente neste ano, enquanto eu dava lançamentos precisos de 57,5 metros no campo do Alim Pedro, namorava a Alice, a morena mais bonita do bairro, e estudava no Amstad, que ficava entre o Postão e cemitério, foi exatamente neste ano que a irmã de Alfredo chamou Sônia e lhe disse algo terrível: Alfredo havia se repoltreado no pecado com uma vizinha sinuosa e a dita cuja estava grávida.
Sônia quedou-se mais destruída do que os pontas que enfrentavam Cabral, o lateral-direito do Canarinho. Amava Alfredo, mas não perdoaria a traição. Não o recebeu mais. Alfredo batia à porta de seu apartamento, e ela não atendia. Alfredo tentou duas vezes, três, 10, 20, tentou por meses de angústia, e Sônia, orgulhosa, não atendeu. Num tempo em que a comunicação se fazia pessoalmente, olho no olho, uma porta fechada era intransponível.
Sônia e Alfredo se separaram em definitivo. O tempo, que apaga ardores e alivia dores, fez o seu trabalho, e cada um tomou um rumo diferente na vida.
Só que, duas décadas depois, em 1996, quando Fernando Henrique era o presidente da República, o Grêmio conquistava o bicampeonato brasileiro e os Mamonas Assassinas morriam num acidente aéreo, naquele ano Sônia descobriu que a irmã de Alfredo havia inventado a história do caso dele com a vizinha.
Por que ela havia feito isso? Talvez porque não aprovasse o relacionamento, talvez porque não gostasse de Sônia, talvez por maldade. Seja. O fato é que deu certo.
Sônia agora, em 2016, 40 anos depois de tudo ocorrido, quando Temer substituirá Dilma na Presidência da República, Grêmio e Inter não são campeões brasileiros e a MPB acabou, agora Sônia me envia um e-mail relatando essa triste história e conclui confessando:
“Alfredo continua sendo, e sempre será, o amor da minha vida”.
Bonito. E triste. Aconteceu no IAPI, a Liverpool do Rio Grande.
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