sexta-feira, 13 de janeiro de 2012


Jaime Cimenti

As gaivotas de Punta del Este

As gaivotas já estavam em Punta com os lobos marinhos, os peixes, as baleias, as areias, as rochas e as águas muito antes de os índios e os gringos chegarem e de o lugar chamar-se Villa Ituzaingó, em 1829. Elas seguiram donas do pedaço depois de 1907, quando a Villa virou Punta. Lá por 1843, carros de madeira puxados por camelos eram os únicos transfers para circular pelas areias.

As gaivotas de Punta não se impressionam com a passagem do tempo e das estações, muitos ou poucos turistas, milionários, artistas e dólares, e nem sabem que Miami é a Punta da América do Norte ou que Punta é a Miami da América do Sul, como o leitor preferir.

As gaivotas curtem o oceano e o Rio da Prata, as pedras e as areias e sobrevoam tudo com a maior categoria. Elas não questionam se existe uma Punta antes do Hotel Conrad e outra depois, mas, de repente, pegam umas sobrinhas de salmão, pato, trufas, ojo de bife, caviar e cerejas frescas, sem preconceito.

Elas viram o local ser construído por italianos, judeus e árabes e nem se espantam em ver que até os sucessivos governos de lá conseguem, mesmo assim, retirar sua fatia do bolo. Gaivotas de Punta não se preocupam em ser algum Fernão Capelo Gaivota da vida, voando e vivendo diferente ou melhor do que os outros, tornando-se best-seller, peça de teatro, videoclipe ou filme de sucesso.

As aves de Punta dispensam a leitura do Eclesiastes e do resto da Bíblia para entender de nascimento, filhos, vida, trabalho, vaidade, dinheiro, sabedoria, morte e eternidade.

Elas simplesmente são. São como o rio, o mar, as rochas, as areias, as manhãs, as tardes, as noites, o sol, as estrelas, a lua e o vaivém das ondas. Elas não estão preocupadas em andar na moda, vestindo shortinho com sapato alto, biquíni ou maiô da Gottex ou botas na praia. Elas não andam na moda. Elas são a moda. São eternas, sem precisar mudar de atitude, penteado, maquiagem, roupas e calçados.

Elas não precisam ser budistas para saber que todas as formas de vida são importantes e que suas existências independem de palavras mais ou menos adequadas de algum falador ou escriba. Sabem que viver é melhor que sonhar, que o amor é uma coisa boa e que qualquer canto é menor do que a vida de qualquer pessoa, como diz a canção de sempre do Belchior.

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