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sexta-feira, 23 de outubro de 2009
23 de outubro de 2009 | N° 16133
DAVID COIMBRA
O carrinho e O Campeão
Não chorei quando assisti ao filme O Campeão lá no longínquo desfecho dos anos 70. Prova de macheza. Todo mundo saía do cinema com os olhos injetados, assoando o nariz, ou em pranto desbragado. Eu, não.
Mas reconheci que a história é comovente. Jon Voight é um boxeador peso-pesado que lesiona o cérebro de tanto levar jabs, uppercuts, cruzados e ganchos. Tem de abandonar os ringues no auge, e se entrega ao jogo e à bebida.
Arruína-se financeiramente, a mulher, uma jovem Faye Dunaway, separa-se dele, todos o consideram um fracasso, menos o filhinho de oito anos, que o venera e o chama de Campeão.
O eixo do filme é a relação entre o pai e o filho. O curioso é que o Jon Voight de verdade, não o personagem, enfrentou problemas com a filha, que, você sabe, é ninguém menos do que a Angelina Jolie.
Ela o acusava de ter abandonado a mãe (dela, claro), emburrou-se, não o procurou mais, levou seis anos para se falarem de novo. Uma vez, tentando a reconciliação, Jon decidiu elogiar a filha de Angelina durante uma cerimônia. No discurso, chamou-a de Shakira. Angelina ficou fula: o nome da menina é Zahara. Para ver como Angelina é injusta. Bota na criança um nome desses e depois a culpa é do pai, se ele se confunde.
Mas o filme. Dias atrás, deparei com uma reprise na TV. Colhi a história pelo meio e não troquei de canal. Aí chegou o momento em que Jon se envolve numa briga, é preso, e conclui que o mundo tem razão: ele, de fato, se trata de um fracasso. Resolve entregar o filho à mãe, agora casada com um nababo. O menino não aceita, chora, implora para ficar com o pai. In extremis, Jon o esbofeteia e manda-o embora. Sente-se arrasado, mas acha que fez o que devia fazer. Sacrificou-se por amor ao filho.
Só que o menino não consegue ficar longe do pai, e tanto insiste, tanto clama pelo Campeão, que Faye o leva de volta para casa. Na cena do reencontro, o menino, vestido com apuro, o cabelo loiro bem penteado, carrega uma malinha que o torna a imagem do desamparo. Acha o pai parado ao pé de uma arquibancada vazia de estádio, deprimido, cabisbaixo. Então, o pai ergue a cabeça. E eles se avistam.
Caminham vacilantes um para o outro. Param a metro e meio de distância. Encaram-se. Abraçam-se, enfim, e juram jamais se separar. E eu, aboletado no sofá da sala, sinto uma bola de sentimentos se formando no meu peito, e a bola escala até a garganta, e logo me embaça o olhar, e percebo que, maldição!, não vou conseguir me controlar, e as lágrimas já me despencam rosto abaixo, e eu choro sem pudor, feito uma bandeirante adolescente.
Depois de ter filhos, a gente fica suscetível a dramas infantis. Que saudade do David durão do longínquo desfecho dos anos 70.
Ainda sobre crianças. Sobre a cena impressiva da semana passada, em que um trem arrasta por 30 metros um carrinho de nenê, e o nenê emerge ileso dos dormentes. O carrinho deslizou pela plataforma da estação, mas a mãe não chegou a ser imprudente, teve apenas um segundo de distração para ajeitar as calças à cintura.
Se houvesse travado o carrinho, ou escorado-o com o pé, ou estacionado-o lateralmente na plataforma, o caso não teria ocorrido.
Um ato singelo de cautela, o pé detendo a roda, a chaleira na boca detrás do fogão, a rua não atravessada, às vezes esse breve gesto é o mais importante de uma vida. Mas ninguém o valoriza, ninguém homenageia a prudência, porque a prudência não acontece, a prudência evita de acontecer.
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