quarta-feira, 14 de outubro de 2009



14 de outubro de 2009 | N° 16124
MARTHA MEDEIROS


Mulheres honestas

Foi apenas em 2005 que aprovaram por unanimidade a exclusão do termo “mulher honesta” do Código Penal. Antes disso, a definição de um crime sexual era: “Ter conjunção carnal com mulher honesta, mediante fraude”. Em bom português, se a mulher era “honesta” (virgem, casada, pudica, casta), o violador ia para a cadeia, mas se a mulher fosse “desonesta” (promíscua, livre, notívaga, festeira), o cara era absolvido e ainda recebia uns tapinhas nas costas.

Hoje, a violência sexual contra qualquer mulher, tenha a profissão ou os hábitos que tiver, é punida de forma igual. Reparem: a diferenciação foi suprimida apenas há quatro anos! Antes disso, a violência sexual, ao menos nos termos da lei, era um castigo merecido para a mulher que não andasse na linha.

Algumas entidades religiosas lamentam até hoje que não haja mais a distinção entre mulher honesta e desonesta, e agora surge um livro para acabar com o restinho de fé dos beatos: o mulherio inteiro fez um pacto com o demo, a julgar pelo candidato a best-seller Why Woman Have Sex: understanding sexual motivations from adventure to revange (“Por que as mulheres fazem sexo: compreendendo suas motivações, desde aventura até vingança”), dos pesquisadores Cindy Meston e David Buss.

Eles entrevistaram mais de mil mulheres entre 18 e 87 anos e descobriram 237 razões diferentes para as mulheres praticarem o bem-bom. Se eu, que não levo uma auréola sobre a cabeça, fiquei espantada com a variedade de motivos, imagine o pessoal do Vaticano e seus discípulos: devem ter desmaiado, acordado e desmaiado de novo.

237 razões diferentes para ir para a cama? Os homens, segundo uma divertida crônica do escritor Marcelo Carneiro da Cunha, julgavam que só existisse uma nobilíssima razão para a gente cometer essa barbaridade: o amor. A selvageria e a cachorrice sempre foram monopólio deles. Que história é essa de a gente ter outro motivo além de estar enfeitiçada pelo príncipe encantado?

Bom, eu consigo imaginar mais umas quatro ou cinco razões para as mulheres curtirem uma lua de mel por algumas horas com um quase desconhecido, além do indiscutível e acalantado amor. Elas (não eu!) podem estar querendo um filho. Podem estar dando o troco no marido galinha. Podem achar que é hora de serem promovidas. Podem estar testando seu poder de sedução. Listei quatro. Vamos ao quinto motivo: elas podem simplesmente estar com vontade, já que sexo é bom. Reparem que usei um adjetivo discreto.

Cinco, mais o amor, somam seis razões, nem todas louváveis. Sobram 231 razões que, na minha santa ingenuidade, não consigo imaginar, mas o livro entrega: elas (não eu!) transam para garantir uma nota alta na prova, para queimar calorias, para ganhar presentes, para agradecer uma carona, para se livrar da enxaqueca, para se exibir para as amigas, para estrear uma lingerie nova, por piedade, pra cumprir promessa, e acredite, transam até em troca de favores domésticos: sou tua, desde que você se encarregue da louça no domingo.

Acabo de listar mais 10 razões, todas igualmente menos elevadas que o amor, e ainda restam inacreditáveis 221 que minha debilitada inspiração não consegue adivinhar. Só sei que, até quatro anos atrás, essas moças entre 18 e 87 anos estariam presas. Hoje estão aí, livres, leves, soltas e esbanjando criatividade.

Bem nesta quarta-feira a gente sai um pouqinho de Lisboa para o interior de Portugal. Dias de céu azul, mar calmo e um sol de verão. Uma linda quarta-feira para todos nós.

Nenhum comentário: