sábado, 17 de agosto de 2024



17 de Agosto de 2024
INFORME ESPECIAL - Rodrigo Lopes

Malabarismo verbal

É constrangedor ouvir o presidente Lula fazer malabarismos verbais para evitar classificar o regime de Nicolás Maduro como ditadura. Em entrevista à Rádio Gaúcha, na manhã de sexta-feira, ele adotou uma nova expressão ao tentar explicar o processo político venezuelano: "viés autoritário".

- A Venezuela vive um regime muito desagradável; não considero que seja uma ditadura no sentido clássico, como muitas outras que conhecemos pelo mundo. É um governo com viés autoritário, mas não se enquadra exatamente na definição de ditadura - disse.

Ora, governos com vieses autoritários, como o de Vladimir Putin na Rússia, de Xi Jinping na China, de Bashar al-Assad na Síria, de Daniel Ortega na Nicarágua, ou de Miguel Díaz-Canel em Cuba, - para ficarmos em exemplos tanto à direita quanto à esquerda - são ditaduras. Poderíamos também chamar de autocracias, regimes autoritários, mas o termo mais popular é... ditadura.

Como assim também o era o regime brasileiro que vigorou entre 1964 e 1985. Ou, para Lula, aqueles eram apenas governos militares de vieses autoritários?

O presidente perde, pela segunda vez no microfone da Rádio Gaúcha, a oportunidade de romper com a fidelidade corrosiva a Maduro. Pouco mais de um ano atrás, em junho de 2023, perguntei a Lula, também na Gaúcha, sobre a dificuldade de considerar a Venezuela uma ditadura. A resposta de que "democracia é um conceito relativo" repercutiu nacionalmente. A emenda saiu pior do que o soneto: na ocasião, o presidente acrescentou que, na Venezuela, haveria mais eleições do que no Brasil.

Estamos acompanhando, desde julho, o tipo de eleições que há por lá: fraudadas, sem transparência e cujos comprovantes estão guardados em algum cofre do Palácio de Miraflores - sem falar nos entraves que o regime impôs à oposição e nas prisões subsequentes.

Com a insistência ao passar pano a Maduro, Lula se isola entre os líderes americanos e evita aproximar-se de uma nova esquerda, representada, por exemplo, pelo presidente chileno, Gabriel Boric, mais conectada a temas contemporâneos e menos presa a ideologias que trazem embutidas o mofo da Guerra Fria. Mais do que isso, Lula erode, por si só, sua capacidade de se tornar líder do Sul Global em geral e da América Latina em particular. _

Mais moderno navio de pesquisas científicas do Atlântico Sul no RS

O mais moderno navio de pesquisas científicas do Atlântico Sul estará na costa do Rio Grande do Sul entre os dias 22 e 28 de agosto. Chamado de Navio de Pesquisa Hidroceanográfico Vital de Oliveira, é operado pela Marinha do Brasil e tem 78 metros de comprimento, com tripulação de 90 militares e capacidade de receber até 40 pesquisadores.

Conforme a Marinha, o Vital de Oliveira prestará apoio à retomada da navegabilidade do Estado, afetado pela enchente. A embarcação conta com 28 equipamentos científicos capazes de mapear danos do leito marinho.

Entre os trabalhos, estão a análise da situação do balizamento, do contorno de costa, dos atracadouros, das estações maregráficas e a existência de possíveis perigos à navegação, informações necessárias ao planejamento da sondagem batimétrica, entre Rio Grande e Porto Alegre. _

Entrevista - Rafael Zimerman

Sobrevivente dos atentados de 7 de outubro em Israel

"Estava dançando e uma hora depois tentaram tirar minha vida"

O paulista Rafael Zimerman havia se mudado para Israel fazia cinco meses em 2023 quando, na madrugada do dia 7 de outubro, tornou-se alvo do terrorismo do Hamas. Um dos sobreviventes do ataque, o jovem está em Porto Alegre para palestras sobre a tragédia e o antissemitismo.

Onde você estava quando começou o massacre?

Na festa, um dos primeiros lugares atacados. Fui para lá com o gaúcho Ranani Glazer e a namorada dele à época, a Rafaela Treistman. Um detalhe: a organização só enviou a localização duas horas antes do evento, por questões de segurança. Quando recebi falando que era próximo da Faixa de Gaza, até questionei o Ranani: é seguro? Nunca havia chegado tão perto.

Como você percebeu que o ataque havia começado?

No momento, eu estava sozinho na frente do palco, dançando. Comecei a ouvir barulhos como se fossem fogos de artifício. Bem rápido me veio à cabeça: "Estamos numa festa aberta, e em Israel não é comum ter fogos de artifício, em uma rave também não". O DJ pegou o microfone e falou em hebraico: "código vermelho". Naquele momento me agachei, fiz posição de defesa e olhei para os lados e cada um estava com uma reação: gente correndo, filmando, chorando.

E o que você fez?

Fiquei um minuto agachado e saí correndo em direção à barraca na qual tínhamos deixado nossas coisas. Encontrei o Ranani e a Rafaela. A primeira coisa que ele falou foi: "Precisamos encontrar um bunker". Saímos correndo em direção à estrada e começamos a pedir carona. Por ser uma cidade próxima de Gaza, na estrada, em pontos de ônibus, há bunkers. Fomos os primeiros a chegar. Era muito pequeno. Confortavelmente cabiam 15 pessoas, no final tinha 40. Já não dava para respirar.

Em que momento os terroristas chegam?

Como só sabíamos que era um ataque aéreo, eu me senti seguro (no bunker). Depois de uns 20 minutos, eu estava encostado na parede e começo a sentir um tiro vindo nas minhas costas, depois outro, só que eles não atravessavam a parede. Depois, uma granada. Virou um desespero: pessoas pedindo para fazer silêncio. Comecei a ouvir vindo do lado de fora uma voz feminina, era uma policial: ela começou a falar no rádio que não conseguiria aguentar, depois de muita troca de tiro. Começo a ouvir vários tiros e o grito que eu não desejo a ninguém ouvir nunca na vida. Os terroristas gritando "Allahu Akbar" ("Deus é grande"), em árabe. Sabia que, quando os terroristas faziam atentados, eles gritavam isso. Você ouve aquele grito e sabe que já era. Eu tinha entendido que era a hora de morrer.

Eles entraram no bunker?

A primeira coisa que eles fazem é tacar um gás. E o pessoal lá dentro fica sem respirar e (busca) sair do bunker. Em 30 segundos, eu não conseguia respirar. Uma menina inclusive mordeu a minha costela, arrancou minha carne. Entrou em desespero. Logo depois, os terroristas começaram a jogar granadas que soltam estilhaços de vidro, pregos. Quando olhei para o lado, acabei vendo o Ranani sendo atingido e agonizando de dor. Vi o meu amigo morrer. Depois de várias granadas, eles jogaram coquetel molotov, e entraram atirando. Desmaiei e, quando acordei, já estava embaixo de vários corpos.

Como falar de paz diante de tanto ódio?

Se eu tiver ódio e querer vingança, vou ter uma vida infeliz. Saí de lá muito agradecido por estar vivo. Não vou mudar o mundo, mas se eu consigo inspirar as pessoas que estão ao meu lado, eu consigo mudar a mim mesmo e a quem está ao meu redor. No final, a vida é um sopro. Eu estava dançando e uma hora depois tentaram tirar a minha vida da pior forma possível. Sou uma pessoa que quer viver, alegre, feliz, que é amada, que ama. Eu não vou fazer a paz no Oriente Médio, mas eu vou espalhar que a paz é o caminho certo para a vida. 

INFORME ESPECIAL

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