quinta-feira, 16 de março de 2017



16 de março de 2017 | N° 18794 
CARLOS GERBASE

LEIA DE GRAÇA MAIS DE 1 MILHÃO DE E-BOOKS


Um gigante do comércio eletrônico pela internet me mandou uma mensagem com a proposta acima. Ela foi direto pro lixo. Não me interesso por 1 milhão de livros, nem de papel, nem eletrônicos, nem em qualquer suporte existente ou que venha a ser inventado. Me interesso pelo que está escrito nos livros e tenho com alguns deles, apenas algumas centenas, uma relação de respeito e amizade, que me faz guardá-los e protegê-los dos cupins e das traças, o que nunca será uma luta inglória, apesar de algumas derrotas humilhantes.

Também não fico emocionado com a possibilidade de acessar 1 milhão de músicas em formato digital, de graça ou pagando uma pequena taxa mensal. Aos 58 anos, meu gosto musical, apesar de eclético – da música barroca de Bach e Vivaldi, ao trip-hop dos anos 1980 e 90, passando, é claro, por Raul Seixas, Velvet Underground e Sex Pistols –, está definido, e de certo modo concretizado, em minhas coleções de LPs e CDs. Isso não me impede de eventualmente procurar coisas novas na internet. Mas eu comando minhas buscas e não preciso de alguém me dizendo: “Se você gostou disso, vai gostar também daquilo”.

A internet é uma máquina de substituir qualidade por quantidade. A rede parece provar, a cada hora, que Heidegger estava certo: estamos agendados pela performance, pelo número, e só vence na vida quem diz sim e se encaixa na armação da técnica. Um milhão de livros. De graça! Pra que serve ter 1 milhão de livros no computador? Pra nada. Eu ficaria fascinado se a rede me dissesse onde encontrar Viagem Interplanetária, de A. E. Van Vogt, o número 9 da Coleção Argonauta. Aquela lacuna na minha estante dá 1 milhão de gritos por dia.

Também não quero, ao contrário de Roberto Carlos, ter 1 milhão de amigos. Tenho alguns milhares de ex-alunos. Gosto de encontrá-los e tentar lembrar o ano em que estivemos juntos numa sala de aula. Nem sempre dá certo. Com os meus 5 mil amigos no Facebook, tenho uma relação interessante: nos falamos de verdade quando alguém consegue dizer alguma coisa original e pessoal, o que é bastante raro. No mais, é uma ferramenta interessante para encontrar pessoas, fazer convites e falar bobagem. Essa última atividade, posso garantir, funciona bem melhor com dois amigos e uma garrafa de vinho.

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