22 DE ABRIL DE 2022
OPINIÃO DA RBS
OS LIMITES DA DEMOCRACIA
O país acompanha, perplexo, mais um confronto entre os poderes da República, agravado pelo recente julgamento de um parlamentar que agride a democracia com o apoio explícito do governo. Por maioria significativa de 10 votos a 1, o plenário do Supremo Tribunal Federal condenou, na última quarta-feira, o deputado federal Daniel Silveira (PTB/RJ) a prisão em regime fechado, multa, perda do mandato e dos direitos políticos, por ataques reiterados à democracia e ameaças a ministros da Corte.
Embora ainda caiba recurso - e a excepcional intervenção do presidente Jair Bolsonaro coloque em suspenso a condenação -, o julgamento embute uma advertência do STF a setores da política e da sociedade que desacatam sistematicamente as instituições democráticas e desrespeitam o Estado de direito. Ao mesmo tempo, o julgamento reacende debates sobre independência dos poderes, liberdade de expressão e imunidade parlamentar, temas amplamente regrados pela Constituição, mas que continuam suscitando controvérsias, especialmente em períodos de polarização política como o atual.
No caso específico, ainda que a chamada dosimetria da pena possa ser questionada, não há dúvida de que o parlamentar agiu dolosamente ao incitar agressões aos integrantes da Suprema Corte em frequentes e repetidas manifestações públicas. Mais do que isso: pregou a invasão e o fechamento do Congresso e do STF, além de sugerir uma confrontação entre as Forças Armadas e as instituições civis. Como bem disse o ministro Alexandre de Moraes ao examinar tais atos na condição de relator, a liberdade de expressão não pode ser escudo protetivo para discursos de ódio contra a democracia e as garantias constitucionais. Portanto, o crime de incitação ficou cabalmente configurado - resultando daí a inequívoca legitimidade da punição.
No atual contexto político do país, porém, não há como ignorar que a sentença provoca desconforto nos simpatizantes do deputado punido, entre os quais a cúpula do governo, além de acirrar um indesejável antagonismo entre os poderes da República. Antes mesmo do decreto de "graça constitucional" do presidente da República, o presidente da Câmara, deputado Arthur Lira (Progressistas-AL), já havia demandado o STF para que o Poder Legislativo tenha a palavra final em casos de cassação de parlamentares nos julgamentos da Corte.
Independentemente das motivações, que dificilmente incluem a alegada comoção da sociedade contra a punição do parlamentar, o contra-ataque do presidente Jair Bolsonaro ao Supremo só agrava um conflito com potencial para perturbar o ambiente democrático do país. Princípios e valores da democracia não podem ser agredidos, boicotados e menosprezados sem que os agressores sejam devidamente responsabilizados de acordo com a legislação. Da mesma forma, a democracia tem limites que devem ser observados por todos, cidadãos comuns e autoridades, sem imposições autoritárias e golpes de esperteza.
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