O MITO DAS UTIs
Mais de um ano depois do início da explosão de casos de covid-19 no Rio Grande do Sul, já se sabe que abrir novas vagas em UTIs é fundamental. Consiste em uma iniciativa capaz de salvar vidas. Mas, a esta altura, deveria estar mais consolidada, na sociedade e nos gestores, a certeza de que é uma ação que passa longe de ser a melhor solução para evitar que o número de mortes volte a subir.
Quando um paciente chega ao hospital, é porque algum dos elos da cadeia de prevenção falhou. Em primeiríssimo lugar, porque não foi possível evitar o contágio, pela mobilidade que facilita a circulação do vírus, por descuidos ou fatalidades e pela falta de testagem e isolamento de casos comprovados e seus contatos, como fazem os países com mais êxito até agora na luta para deter a peste. É, por isso, preocupante o novo aumento dos números da covid-19 em várias regiões do Rio Grande do Sul. O quadro impõe medidas rígidas de controle que evitem a escalada das contaminações, evitando maior pressão sobre o já estressado sistema hospitalar.
Nunca é demais ressaltar a qualificação e a dedicação de milhares de profissionais da saúde que labutam no Estado. Graças ao seu empenho, evitou-se que a contagem funesta da pandemia fosse ainda mais assustadora. Seus esforços desmedidos foram decisivos para poupar vidas, dor e sofrimento. Mas se autoridades e cidadãos não transformarem o aprendizado desses 15 meses de pandemia em conscientização e ações concretas, se continuará a apenas enxugar gelo nos hospitais e uma quantidade maior de famílias acabará enlutada.
O país e o Rio Grande do Sul poderiam estar em uma situação não tão dramática, não fosse o desdém com que o vírus foi tratado desde os primeiros meses da crise sanitária. A população e o tecido econômico pagam a conta de uma série de decisões políticas equivocadas. Pior do que isso, da teimosia de persistir no erro, como rechaçar medidas não farmacológicas e manter a aposta em pretensas balas de prata que se mostraram ineficazes. Essas condutas devem ser investigadas, mas não apenas motivadas pelo furor condenatório. Há de se acertar as contas com o passado, mas é tarefa primordial, neste momento, impedir novas mortes evitáveis. Por isso, orientações irresponsáveis e atos inadequados que contribuíram com a aceleração do número de vítimas fatais devem gerar uma ampla reflexão que leve à não repetição dos erros.
Hoje, quando um doente com covid-19 precisa de uma UTI e encontra uma vaga, há um falso sentimento de alívio e de vitória. Na verdade, se alguém necessita internação, é porque algo que poderia ter sido feito antes não aconteceu. São dois os eixos que devem merecer os maiores esforços, agora: de um lado, vacinar cada vez mais. De outro, impedir a contaminação que já matou mais de 440 mil brasileiros. A solução está nas mãos não apenas dos governos, mas de cada cidadão. Acreditar apenas na expansão de UTIs é um mito. E mitos, como se sabe, estão mais próximos da fantasia do que da realidade.
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