quarta-feira, 24 de setembro de 2025


24 de Setembro de 2025
OPINIÃO DA RBS

Uma porta para o diálogo

O discurso de Donald Trump na abertura da Assembleia Geral da ONU se encaminhava ontem para o final e tudo indicava que não seria aberta nenhuma fresta para um diálogo capaz de distensionar o pior momento dos mais de 200 anos de relações diplomáticas entre Estados Unidos e Brasil. Minutos antes, o homólogo brasileiro, Luiz Inácio Lula da Silva, encerrara um pronunciamento duro e eivado de críticas à postura do governo norte-americano. No dia anterior, a Casa Branca havia imposto novas sanções a brasileiros, como o advogado-geral da União, Jorge Messias, que teve o visto de entrada nos EUA revogado, e a esposa do ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Alexandre de Moraes, Viviane Barci de Moraes, atingida pela Lei Magnitsky.

Tudo mudou de repente, quando da tribuna Trump revelou um rápido encontro com Lula nos bastidores. Contou que os dois se abraçaram e marcaram uma reunião para a próxima semana. De forma surpreendente, o norte-americano chegou a mencionar "uma química excelente" com o par brasileiro, embora também tenha alvejado o país com sua metralhadora giratória de críticas por "censura, repressão, corrupção judicial e perseguição a críticos políticos".

Diante de um impasse político e econômico que parecia sem qualquer perspectiva de solução, é alvissareiro que Trump e Lula tenham concordado em conversar. Não se sabe ainda se seria um encontro presencial, e em qual local ocorreria, ou se seria por telefone ou vídeo. Mas, com os demais canais diplomáticos obstruídos, um diálogo frontal entre os dois presidentes é a melhor forma de cada um apresentar seus pontos de vista e argumentos e dar início a uma possível negociação em torno dos temas abordados. Caso predomine a pauta econômica, em especial sobre comércio e as tarifas que chegam a 50% sobre itens brasileiros exportados para os EUA, seria possível esperar avanços em tratativas que tragam benefícios aos dois lados.

É recomendável, porém, manter cautela e expectativas moderadas. Trump tem a imprevisibilidade como marca. Torna-se necessário, portanto, que a diplomacia brasileira prepare bem a conversa e minimize o risco de surpresas no caso de uma eventual ida de Lula à Casa Branca. O norte-americano não é exatamente um anfitrião afável, como demonstrou com os constrangimentos que impôs neste ano aos presidentes da Ucrânia, Volodimir Zelensky, e da África do Sul, Cyril Ramaphosa, e ao primeiro-ministro do Canadá, Mark Carney.

Espera-se também que não surtam qualquer efeito eventuais tentativas de figuras como o deputado federal Eduardo Bolsonaro (PL-SP), autoexilado nos EUA, para sabotar o contato. O parlamentar, como se sabe, é um dos articuladores das medidas contra a economia brasileira e um dos que tentam interferir na soberania do país e na independência do Judiciário nacional, pressionando para livrar o pai, o ex-presidente Jair Bolsonaro, da condenação por tentativa de golpe de Estado.

Ainda que seja necessário prudência, é possível ter alguma esperança de desescalada das tensões. Se o diálogo for travado no campo da racionalidade, pode render à frente algum grau de alívio no tarifaço que castiga de forma proporcionalmente maior a indústria do RS. 

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