quarta-feira, 24 de setembro de 2025


24 de Setembro de 2025
CARPINEJAR

O sufoco de perder a aliança

Caio Bonfim, 34 anos, conquistou o título de campeão dos 20km da marcha atlética em prova disputada no Mundial de Osaka, no sábado, e se consagrou o maior medalhista do Brasil em Mundiais de Atletismo.

Mas quando atravessou a linha de chegada, quando alcançou o mais alto degrau do pódio de sua história, depois do bronze em Londres (2017) e Budapeste (2023) e da prata nos 35km desta edição, ele expressava só apreensão. Não sorria, porque percebeu que sua aliança de casamento havia escorregado durante o percurso.

A medalha de ouro não apagava a tristeza do extravio do ouro doméstico. A alegria só foi completa quando o anel foi encontrado em mutirão pela população de Osaka.

Caio e Juliana se casaram em novembro de 2016, e as joias que selaram o amor estão há mais de 30 anos na família, pertenceram antes aos pais do campeão mundial, João e Gianetti Sena.

Não há um símbolo tão poderoso, tão influente, a ponto de manchar a coroação de um atleta em sua melhor fase profissional. Separar-se da própria aliança pode prejudicar seu matrimônio. É o único bem vitalício que não deve sumir da vista.

Não tem como creditar ao descuido. É como a argola de uma granada: uma vez subtraída, tudo explode. Como explicar que o adereço, feito sob medida, preso às pregas de flexão, simplesmente se soltou do nada? A situação sugere que o marmanjo agiu de propósito, não querendo se mostrar comprometido.

Parece que está sendo desleal, infiel, bancando o solteiro para prospectar casos. Nenhuma esposa entende. Nenhuma esposa engole a versão de uma distração. Nenhuma esposa, por mais generosa que seja, admite desculpas e justificativas.

Um anelar vazio soa como culpa no cartório. A ausência é uma confissão do marido, ou, no mínimo, o pivô do curto-circuito de seu raciocínio. Eu não tiro a aliança nem para tomar banho, nem para lavar a louça, nem para fazer musculação.

Já a perdi em duas ocasiões, e não pretendo passar pela terceira experiência. O coração sai pela garganta, principalmente quando se é inocente de segundas intenções.

O episódio mais recente foi numa quadra de futevôlei em Capão da Canoa. Eu suspendi a partida para engatinhar na areia, tentando decifrar algum brilho diferente na extensão dourada. Como definir um aro entre grãos da mesma cor? Naquele instante de profundo desamparo, pensei em adquirir um detector de metais, um aparelho com uma haste e uma bobina circular na ponta, com o qual se vasculha o solo, muito usado para localizar moedas enterradas.

Ao revê-la, senti que ganhara na loteria. Nem mais valeria a pena jogar Eu tinha gastado toda a minha sorte. O incidente mais tenso aconteceu no dia de meu casamento com Beatriz. Eu era o responsável por levar o par. Desconfiado da minha memória na véspera do altar, coloquei a minha no dedo certo e a dela boiando no mindinho.

A fim de relaxar para os votos, fui nadar na piscina olímpica do hotel. Não é que a dela me escapou entre as braçadas? Faltavam apenas três horas para a cerimônia e precisava resgatá-la no fundo azul do oceano da minha raia. Ia e voltava nos mergulhos, espanando o piso.

Na momento em que disse "sim", com o objeto recuperado, eu cheirava a cloro. Por pouco não me casei de sunga. 

CARPINEJAR

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