elio gaspari
03/05/2015 02h00
O sigilo dos
petrocomissários
Nascido
na Itália, veio ainda criança para o Brasil, onde fez sua carreira
jornalística. Recebeu o prêmio de melhor ensaio da ABL em 2003 por 'As Ilusões
Armadas'. Escreve às quartas-feiras e domingos.
O
repórter Fábio Fabrini revelou que a Petrobras destruiu os vídeos onde estavam
gravadas as discussões de seu Conselho de Administração. Para uma empresa que
está coberta por uma névoa de suspeitas, não poderia haver notícia pior. O
comissariado informa que essas gravações servem como subsídio para a redação
das atas e, feito esse serviço, são apagadas. Contudo, não mostra a norma que
determina esse procedimento. Pelo que lá aconteceu, a Petrobras ficou numa
situação em que lá tudo pode ter acontecido. Se ela andar sobre as águas dirão
que não sabe nadar.
Quem
grava e apaga os debates de uma reunião só age dessa forma porque está
interessado em suprimir alguma coisa do conhecimento dos outros. Todos os
áudios das reuniões do conselho da Petrobras poderiam ser armazenados num pen
drive do tamanho de um isqueiro. O mesmo acontece com as reuniões do Copom do
Banco Central, que jamais deu uma explicação convincente para sua conduta. (O
seu similar americano divulga as transcrições dos áudios a cada cinco anos. Se
o BC quiser, pode criar um embargo de vinte anos. O que não pode é apagar o que
se diz nas suas reuniões.)
O
apagão da Petrobras só servirá para ampliar o grau de suspeita que hoje envolve
suas práticas, sobretudo porque lá estavam as intervenções da doutora Dilma,
que presidiu o conselho da empresa. Não há uma lei que mande preservá-los, mas
destruí-los ofende o senso comum.
Fica
feio para a jovem democracia brasileira que funcionários do Planalto tenham
registrado súmulas das audiências de Lula em seus laptops particulares ou que
tratem de assuntos de Estado em endereços eletrônicos privados. O que ficou nos
laptops sumiu. Sumiram também os registros de algumas reuniões gravadas.
Fica
feio, porque durante a ditadura o marechal Costa e Silva gravou a reunião em
que se discutiu a promulgação do Ato Institucional nº 5 e preservou-se a fita.
Graças a isso pode-se provar que a ata de 1968 foi editada. O famoso "às
favas todos os escrúpulos" do ministro Jarbas Passarinho na ata virou
"ignoro todos os escrúpulos". Durante a experiência parlamentarista
de 1961 a 1963
preservaram-se as notas taquigráficas das reuniões do Conselho de Ministros.
Muitos
companheiros reclamam que documentos da ditadura desapareceram. É verdade, mas
não deveriam apagar a memória da democracia.
PEIXES
GORDOS
Os
procuradores da República que investigam os peixes gordos com foro especial em
Brasília ouviram demoradamente o "amigo Paulinho". Começou um
procedimento de verificação dos depoimentos dados ao pessoal de Curitiba. É
possível que já se tenha fechado o círculo em torno de uma movimentação de
dinheiro.
A
votação da Segunda Turma do STF no caso do habeas corpus dos empreiteiros
mostrou que na bancada minoritária ficaram os ministros Celso de Melo e Cármen
Lúcia (com a faca nos dentes). É improvável que Teori Zavascki ou Gilmar Mendes
formem uma linha de zagueiros com Dias Toffoli.
SEM
BRAVATA
O
Itamaraty sinalizou que recebeu um recado do governo da Indonésia e evitou
adjetivos estridentes ao reclamar da execução do traficante de drogas Rodrigo
Gularte.
Depois
da pirraça da doutora Dilma recusando-se a receber as credenciais do novo
embaixador indonésio, a venda de 16 Super Tucanos da Embraer foi colocada na
frigideira.
BETO
CABRAL
Vozes
serenas do tucanato enviaram sinais ao governador Beto Richa alertando-o para
os riscos de rodar o software Sérgio Cabral 2.0.
Graças
à fé infinita de Cabral no porrete da PM, o governador reeleito com dois terços
dos votos em 2010 tem evitado circular nas ruas do Rio.
EREMILDO,
O IDIOTA
Eremildo
é um idiota. Ele acha que pagando-se R$ 11 mil por mês aos membros do Conselho
de Administração dos Recursos Fiscais acaba-se com uma roubalheira onde um
refresco para um banco autuado pela Receita rendia uma propina de R$ 28
milhões.
MAIS
UM
Nesta
semana devem começar em Curitiba as conversas para mais um acordo de
colaboração nas investigações da Lava Jato.
Elas
terão uma nova essência. O novo colaborador poderá contar muitas coisas de seu
negócio, mas seu testemunho será valioso para narrar encontros que teve com
petrocomissários que estão presos, aferrados a negativas.
LI
KEQIANG
No
dia 19 chega ao Brasil o primeiro-ministro chinês Li Keqiang. Tomara que não se
repitam trapalhadas como a da visita do presidente Hu Jintao ou a da ida da
doutora Dilma a Pequim em 2011.
Li é
um superadministrador. Economista, fluente em inglês, deu uma demonstração de
seu espírito prático em 2007. Conversando com o embaixador britânico, disse-lhe
que não dava muita bola para o indicador do PIB, no qual há fortes influencias
subjetivas. Ele preferia olhar para três indicadores brutos: o consumo de
energia, o volume do crédito e a movimentação de cargas nas ferrovias. Nasceu
aí o que hoje se chama "Índice Li" (Como as ferrovias brasileiras são
o que são, não se deve brincar com essa variável).
Se
esse índice é melhor que o do PIB, desde agosto do ano passado a economia
chinesa vai devagar, no pior nível desde 2004.
TERCEIRIZAÇÃO
A
voracidade com que trabalharam os interesses favoráveis à nova lei das
terceirizações tornou-se um presente de Dia das Mães para a doutora Dilma.
Sob
a inspiração de Lula, deram-lhe uma bandeira capaz de recuperar o apoio de
trabalhadores pela preservação de seus direitos.
CARLOS
LACERDA VIVE
Um
obsessivo conhecedor da vida política brasileira bateu num tesouro. Encontrou
dois vídeos da passagem de Carlos Lacerda por Portugal, no segundo semestre de
1964. Num registrou-se uma entrevista coletiva de meia hora. Noutro, uma
palestra de quase uma hora, exibida pela televisão portuguesa, com direito a
quadro negro.
Existem
poucos vídeos tão extensos mostrando o desempenho do brilhante orador que foi
Lacerda. Foi o primeiro a tirar proveito da televisão e, salvo Lula com outro
estilo, ninguém se igualou a ele.
A
História é trapaceira. Na palestra, ele defende o projeto colonial de Portugal
em Angola e Moçambique, sustentando que a ideia da autodeterminação dos povos
africanos era uma forma de racismo. Sua defesa do colonialismo português é um
exemplo de como um administrador moderno e capaz pode conviver com um político
retrógrado e oportunista.
A
forma como o "Corvo" cavalgava o tema da corrupção e do combate ao
esquerdismo do regime deposto em 1964 poderia levá-lo a qualquer carro de som
das manifestações de hoje na avenida Paulista. Seria um prazer ouvi-lo. Quatro
anos depois, ele estava preso num quartel da PM.
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