03
de maio de 2015 | N° 18151
ANTONIO
PRATA
O último a sair
Desde
os longínquos anos oitenta do século passado, quando perigava do Lula ganhar as
eleições presidenciais, a direita brasileira ameaça deixar o país. Segundo apregoava
o então presidente da Fiesp, Mario Amato, em caso de uma vitória petista, 800
mil empresários picariam a mula: “O último a sair, por favor, apague a luz do
aeroporto”, teria dito.
Neste
segundo mandato de Dilma Rousseff, o projeto da diá$pora voltou com tudo. Pelo
que leio e ouço por aí, tem mais rico brasileiro se mudando pra Miami, hoje, do
que turista japonês tirando foto da Mona Lisa, no Louvre.
Acho
curioso. Se alguém deveria estar contente com o estado das coisas, é a direita.
Os índices de aprovação da presidente são os mais baixos da história; o
congresso quer rever o estatuto do desarmamento e diminuir a maioridade penal,
já disse que não vai tocar no tema do aborto e tenta retroceder nas conquistas
LGBT; Bolsonaro & Feliciano fazem mais sucesso do que Chitãozinho &
Xororó; e a PM que desce o sarrafo em professores e mata criança com tiro de
fuzil é aplaudida em passeatas “ordeiras” e “pacíficas”. Se eu fosse de
direita, não estaria pensando em fugir pra Miami, mas em construir uma Disney lá
pros lados de Barueri.
Quem
tem motivo para se arrastar por aí chutando tampinha e rosnando pra lua somos nós,
companheiros, que colamos o adesivo “oPTei” em nossos Chevettes, lá por 1987, nós
que cantamos o “Lula Lá” como se fosse um “Abre-te, Sésamo!” para Shangri-Lá,
achando que o PT iria levar pão, poesia, matemática e tomografia para cada
brasileiro. Que tristeza: apostamos num partido fundado por Sérgio Buarque de
Holanda e Chico Mendes para fazer “dessa vergonha, uma nação”, como cantou
Caetano Veloso, e, hoje, nossa expectativa mais otimista são alguns quilômetros
de ciclovia.
É preciso
reagir, meus caros. É preciso tirar da direita as rédeas da história. É preciso
dar um passo à frente e dizer: péra lá, não são vocês que vão embora, com seus
jacarezinhos no peito e Rolex no pulso, somos nós, com nossas pochetes na
cintura e barbas por fazer! Chega de tentar tirar o gigante adormecido do seu
berço esplêndido. (Aliás, um gigante de 500 anos que ainda dorme em berço, já era
para termos nos tocado, tem algum problema bem sério). Chega de querer
construir um país do zero: nos mudemos, de mala e cuia, para um que já esteja
pronto.
Para
onde vamos? Pra Miami? Evidente que não. Vamos para outra cidade onde a língua
também é o espanhol, mas num país cujo governo é – verdadeiramente – de
esquerda, a maconha é liberada, o vinho é de primeira, a carne é estupenda e o
maior defeito, ao que parece, é fazer fronteira com o Brasil. Estou falando,
claro, do Uruguai.
Se o
Haddad perseverar e o MP parar de encher o saco, talvez consigamos ir de
bicicleta até o porto de Santos, de onde seguiremos, em comboio, de pedalinho,
rumo ao Éden cisplatino. Às margens do Prata, fundaremos a nova Colônia Cecília,
requereremos nacionalidade uruguaia, e, ao recebê-la, sob o radioso sol de
nossa alviceleste bandeira, brindaremos com Tannat, simultaneamente, duas tão
sonhadas conquistas: um país justo e a Copa de 50.
O último
a sair, por favor, acenda o baseado.
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