quarta-feira, 10 de agosto de 2011



10 de agosto de 2011 | N° 16788
ARTIGOS - Jorge Alberto Salton*


Ambulatório das falsas crenças

Em 1998, o médico Alan Berkenwald publicou no Annals of Internal Medicina, com o título “Em nome da medicina”, um artigo sobre o número impressionante de terapias não científicas oferecidas à sociedade.

Desde então, a chamada “medicina alternativa” ganhou corpo, organização e capacidade de divulgação na mídia. Hoje, inclusive, passa a disputar espaço entre os estudantes de Medicina. Se uma dessas terapias alternativas conseguisse, mediante pesquisa adequada, comprovar sua eficiência, a medicina científica passaria também a empregá-la.

Quem pratica tais terapias tem a vantagem de, em geral, receber diretamente do cliente, de forma particular, e não por convênios. Não tem sobre si o rígido Código de Ética Médica, além de correr um risco muito menor de sofrer processos.

Existem casos extremos de terapia alternativa, desde tratamentos tipo “terapias de vidas passadas”, até tratamentos mais próximos da medicina tradicional, que, por força do grupo relacionado a essa prática, conseguem abrir espaço nas associações médicas.

Propala-se que nos atendimentos é indispensável a “arte” de quem atende. A resposta é positiva, se o procedimento se faz por meio de uma técnica embasada no método científico.

François Jacob, Prêmio Nobel de Medicina de 1965, escreveu: “O que há de comum – entre ciência e arte – é o fato de que no começo de tudo há um esforço de imaginação. Dele tanto depende a ciência quanto a poesia, só que o cientista é obrigado a confrontar a realidade imaginada com a realidade em si, enquanto o poeta pode fazer qualquer coisa”.

A invasão do espaço destinado à ciência obriga entidades médicas e faculdades de Medicina a periodicamente retomar a discussão da questão e a fazê-la de forma criativa. Atualmente, citando como exemplo, circula no meio médico o longa-metragem Ambulatório das Falsas Crenças, que trata da luta dos profissionais para manter-se dentro do método científico e resistir ao canto de sereia da pseudociência.

Platão personifica a ciência ao dizer: “A palavra tem de concordar com o fato”. Já a pseudociência é muito bem representada pelo personagem de Nelson Rodrigues que descaradamente declara: “Se os fatos estão contra mim (ou contra minhas crenças), azar dos fatos”.

*Médico psiquiatra, professor da Faculdade de Medicina da UPF

Nenhum comentário: