16 DE AGOSTO DE 2022
NÍLSON SOUZA
O menino dos três chapéus
Esta não é uma crônica sobre futebol, é sobre o futuro, embora o chapéu referido no título seja mesmo aquele do lance futebolístico que ocorre quando um jogador lança a bola por sobre a cabeça do marcador e a apara do outro lado. O movimento também é conhecido como lençol ou balãozinho, essa última a definição mais popular aqui pelas bandas do Sul.
Pois bem, outro dia, num jogo entre garotos na cidade mineira de Nova Era, um menino "chapelou" três adversários e, sem deixar a bola cair, marcou um golaço. A demonstração de habilidade, gravada pelo celular da mãe de um dos competidores, viralizou de tal forma nas redes sociais que conquistou espaço no Jornal Nacional. Em consequência, Davi Luiz, de 12 anos, virou celebridade instantânea, ganhou uma camisa do Flamengo, mensagem do seu xará da Seleção Brasileira e destaque em vários veículos de comunicação.
Eis aí um exemplo do futuro previsto pelo cineasta norte-americano Andy Warhol, aquele em que todos têm direito a 15 minutos de fama. Como nada envelhece mais rápido do que o futuro, torço para que o pequeno Davi saboreie devidamente o seu momento de alegria e visibilidade, que talvez jamais se repita. Se ele levar adiante o seu desejo de se tornar jogador de futebol, então, dificilmente terá outra oportunidade de aplicar o chapéu triplo, pois já nas categorias de base os treinadores castram o drible e exigem jogar de primeira, em nome do coletivo e da vitória a qualquer preço. O jogador que aplica três balõezinhos corre o risco de ser chamado de irresponsável, isso se não for agredido por algum adversário mal-humorado.
No admirável mundo novo da tecnologia, tudo é efêmero e pragmático. Graças ao telefone móvel que grava imagens e à internet, que permite transmitir informações para os quatro cantos do mundo, qualquer pessoa pode saltar do anonimato para a fama. Mas o sucesso abrupto não garante permanência no Olimpo. Para virar um Neymar, como almeja, o mineirinho terá que tomar vitaminas, submeter-se a treinamentos rigorosos, substituir o prazer pela competição e, muito provavelmente, usar um daqueles sutiãs que monitoram batimentos cardíacos, controlam a distância percorrida, a intensidade e a aceleração dos atletas em campo. Sairá de cena o moleque feliz, entrará a máquina de jogar.
Se esse for o seu propósito, tomara que o alcance. Se não alcançar, como ocorre com a maioria dos garotos que sonham o mesmo sonho nas periferias do país, pelo menos terá o registro daquele futuro que já se foi e que, involuntariamente, compartilhou conosco. Carpe diem, garoto!
NÍLSON SOUZA
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