quinta-feira, 7 de abril de 2016



tati bernardi
21/04/2014  03h00

Gata, eu não quero ver a sua xota

Gosto desses hospitais que poderiam estar num guia de hotéis três estrelas de Miami. Quanto mais brega, mais eu confio: com salão de beleza e "concerto de piano" na recepção. Só faltam vender "café da manhã incluso também para os hóspedes do quarto standard apêndice". Vejo um médico cheio de doutorado e álcool gel e quase posso imaginar sua cueca vermelha por cima do collant azul. Todo ano fico presa na "malha fina" do imposto de renda porque ninguém acredita que uma jovem possa gastar tanto dinheiro com consultórios, exames e tratamentos. Eis minha maior (e mais vergonhosa) luxuria.

Apesar de minhas limitações de urbanoide hipocondríaca, respeito, apoio e aplaudo quem escolhe parir nesse esquema humanizado-natureba-doula. Na banheira, na cachoeira, num ritual indígena, num chalé em monte verde. A mulher é dona do seu corpo e acho lindo ser espiritualizada, evoluída e ecomamy. Se eu não tivesse nascido tão besta, certamente seria uma pessoa legal.

Mas, sinceramente, já que a pessoa é tão amante da natureza e bacana, por que cazzo ela não abre mão também de postar no Facebook um monte de fotos desse momentinho sanguinolento tão íntimo e pouco tecnológico?

Virou moda! Tô eu lá no "face" vendo como a namorada do meu ex namorado é baranga e burra (na minha fantasia) e de repente, pula na minha cara, sem cerimônia ou timidez, uma xoxota arreganhada ao molho sugo parindo uma vidinha.

Custa só postar o resultado? Tudo bem se não tiveram o bom gosto de dar uma limpadinha no bebê, ele envolto em secreções sebáceas também é puro amor. Ser mãe é lindo e seu filho é uma dádiva dos céus mas...a sua xuranha berrando na minha tela plana de led retroiluminada é a visão do inferno.

Você quer mesmo que o tio Miltinho de Passos de Itu e a vó Carminha de Serra Negra vejam seus grandes lábios pelo tumblr? A intenção não era só celebrar a vida do pequeno Zabelê? Sua prexeca sofrida na internet não é celebração de liberdade, é apenas mau gosto. Abraça uma árvore mas não faz mais isso não, tá?

Recentemente fui a casa de um amigo. Ele veio todo feliz me mostrar as fotos do parto humanizado de sua esposa. Torci com o que me resta de fé na humanidade pra ver um albunzinho fofo e meigo mas...lá estava ela. A ximbica da mulher dele, pra quem quisesse ver, acompanhada de muita dor, sangue, melecas e posições esdrúxulas.

Tá, você colocou uma banheira de plástico no meio da sala e convidou os amigos mais chegados pra curtir de pertinho você com cara de "fodeu, essa porra dói pra cacete". A piscininha virou um marzinho de sangue mas todo mundo pensou que a vida tem dessas e seguiu comendo as esfihas de verdura. Tudo isso eu acho legal e apoio. O que me mata é saber que tem uma foto com trinta centímetros de diâmetro entre a sua virilha direita e a sua virilha esquerda na minha timeline. Te pergunto: pra quê? Sério. Eu até gostaria de ver seu filho, mas particularidades tais quais o seu colo do útero dilatado e a sua placentinha são um pouco oversharing pra mim.

Se for pra brindar com os amigos a sua coragem e amor à mãe natureza, fotos escalando montanhas também são cheias de matagais, cavernas e curvas.

PS: Antes que alguma fofolete mala pseudo socióloga com profunda incapacidade de interpretação de texto me escreva dizendo que sou contra partos humanizados ou sou machista porque sou contra a genitália desnuda em minha timeline, já me antecipo aqui dizendo: olha, santa, volta pro ginásio, prova de português, pede pra tia Celina te ensinar a ler um texto, não me envergonha, vai! Não sou contra nada, apenas me dou o direito, tal qual uma xereca parideira pontocom, de me expor sem medo de ser infeliz.
É escritora, redatora,roteirista de cinema e televisão e tem quatro livros publicados. Escreve às sextas.

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