14 de abril de 2016 | N° 18499
DAVID COIMBRA
De onde veio a nova direita
Fala-se muito hoje, no Brasil, no surgimento da “nova direita”. O que pressupõe que tivesse existido uma “velha direita”.
Qual seria a velha direita?
A direita, ao contrário da esquerda, nunca foi orgânica, no Brasil. Antes de Getúlio, nas três décadas da jovem República tão precocemente golpeada, esses conceitos de esquerda e direita eram muito vagos no país. O debate, no começo do século 20, era entre os novos republicanos e os saudosos da monarquia. Depois, as disputas se tornaram mais estaduais do que propriamente ideológicas. Getúlio só foi se definir como um populista de esquerda nos anos 1940, quando o Ocidente convergia para a garantia de direitos sociais.
Os ditadores foram pródigos na “defesa dos trabalhadores”. Hitler chegou a obrigar as fábricas a conceder uma caneca de chope de graça para os operários, nos intervalos de descanso na jornada de trabalho. E, a pedido dele, o Fusca foi desenhado por Porsche para ser o “carro do povo”.
No Brasil, depois que Getúlio saiu da vida para entrar na história, a UDN, de Jânio, foi certamente um partido de direita. Mas não Jânio. Jânio não era coisa alguma. Ou, antes: era um populista capaz de condecorar Che Guevara ao mesmo tempo em que proibia o uso do biquíni nas praias e piscinas de todo o território nacional, por considerar essa peça de roupa “indecente”.
A ditadura militar também era de direita, só que a ditadura militar não tinha voto; tinha canhões. Quer dizer: não havia uma organização política, dogmática, de direita, como, sei lá, um Partido Conservador. Havia a ditadura e o partido que defendia a ditadura, a Arena, que se batia contra a oposição comportada à ditadura, o MDB.
Já a esquerda, mesmo restrita a organizações clandestinas, como o velho Partidão, era movida por uma doutrina, por um pensamento, por um método. A esquerda sempre foi institucional, a direita sempre foi oportunista.
Lula, quando surgiu, não era de direita nem de esquerda. O general Leônidas Pires Gonçalves, que era um homem muito inteligente, dizia que Lula sempre foi “intrassistêmico”. Queria, com isso, dizer que Lula não era um “subversivo”, como eles chamavam os mais ardorosos contestadores do regime.
Subversivos eram Prestes, José Dirceu, José Genoíno, Brizola, Miguel Arraes, Francisco Julião. Esses eram homens de esquerda, ideológicos, com retórica e formação.
A direita sempre foi disforme.
Um intelectual de direita, aliás brilhante, era Roberto Campos. Esse, sim, movia-se por um pensamento lógico. Roberto Campos dizia que nunca houve capitalismo de verdade no Brasil. Que o capitalismo brasileiro era patrimonialista. Isto é: protegia os donos do capital, enquanto que o verdadeiro capitalismo implica correr riscos.
Mas Roberto Campos, como Simonsen e Delfim, era mais teórico do que político. Pensava muito e agia pouco, politicamente falando. A direita sempre foi um exercício de alguns poucos intelectuais.
Agora, pela primeira vez, a direita se assume, no Brasil, e se torna um movimento popular. Há movimentos de direita explodindo por todo lugar, desde neoliberais na economia a ultraconservadores nos costumes.
Quem os pariu? O PT.
O PT é responsável pelo estabelecimento da primeira direita orgânica e popular da história do Brasil. No momento em que o governo consagrou o discurso da elite branca versus pretos e pobres, jogou grande parte do país no outro lado. É a terceira lei de Newton, de ação e reação. Um governo que se diz de uma classe só pode encontrar resistência nas demais classes. O PT não dividiu o país, porque o país não está dividido: está unido. Contra o PT.
Cada vez que um petista mia que o partido é perseguido por defender os pobres, solidifica a união contra o partido. O PT poderia aprender com Obama: um presidente negro não deve ser um presidente dos negros. Deve ser presidente de todos.
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