segunda-feira, 18 de abril de 2016


18 de abril de 2016 | N° 18502

OLHAR GLOBAL | Luiz Antônio Araujo

No Exterior, economia preocupa mais


Embora a maior crise política em mais de 20 anos no Brasil tenha minado o mandato de Dilma Rousseff, o impacto global dos acontecimentos do último mês no país é modesto. Desde que deixamos de ser conhecidos pelo binômio Carnaval-futebol para nos tornarmos o “B” do bloco emergente conhecido como Brics, é lugar comum cotejar a realidade brasileira com as vicissitudes de Rússia, China, Índia e África do Sul. Em todos esses países, a fraca recuperação mundial após a Grande Recessão de 2007-2009 provocou distintas combinações de apagão produtivo e curto-circuito político. Por isso, há pouca surpresa com o que acontece do lado de cá do Atlântico.

Dos dois componentes da crise brasileira, o que inspira maiores cuidados no Exterior é a economia. Ao lado da Rússia, o país tem sido citado com frequência como responsável por frear a recuperação global. Segundo relatório do Fundo Monetário Internacional (FMI) divulgado na quarta-feira, a necessidade das maiores empresas brasileiras de incrementar provisões para arcar com juros de dívidas provocou queda de lucros e redução de liquidez. A perspectiva de que o Brasil complete em 2017 três anos de recessão é vista com consternação, mas a lenta recuperação dos Estados Unidos, o marasmo da economia japonesa e as dificuldades da Rússia são tidos como mais graves.

Eleita em 2010, Dilma alcançou certa projeção como “segunda mulher mais poderosa do mundo” (depois da chanceler alemã, Angela Merkel, também em dificuldades em razão das tensões europeias e da crise de refugiados). Em 2013, a revista Foreign Policy incluiu-a na sua prestigiosa lista anual dos Cem Pensadores Globais por “confrontar Washington e seus espiões”. Referia-se ao episódio de arapongagem internacional revelado por Edward Snowden no chamado escândalo WikiLeaks – a presidente tinha sido um dos alvos de monitoramento do sistema Prism, do governo americano. Dilma, que havia recebido o presidente dos EUA, Barack Obama, em 2011, adiou por um ano uma visita a Washington em repúdio à bisbilhotice. Nas relações bilaterais, porém, pouco mudou. Obama continuou tão desinteressado pelo Brasil como antes.

Em seus pouco mais de cinco anos na Presidência, Dilma não exibiu nada próximo do apetite de seu padrinho, Luiz Inácio Lula da Silva, pelo ativismo diplomático. A atrapalhada fuga do senador boliviano Roger Pinto, de La Paz a Brasília, a bordo de um carro ao lado de um diplomata brasileiro custou o cargo a Antônio Patriota, primeiro chanceler da presidente. Ele foi substituído por Mauro Vieira, ainda mais discreto.

Talvez num reflexo do perfil internacionalmente apagado de seu governo, a solidariedade colhida nas últimas semanas foi protocolar e difusa. O apoio mais vigoroso, embora de eficácia duvidosa, veio do secretário-geral da Organização dos Estados Americanos (OEA), o uruguaio Luis Almagro, que estranhou a inexistência de “certezas jurídicas” contra a presidente.

Ao longo do domingo, brasileiros reuniram-se em manifestações a favor e contra o governo Dilma em Berlim, Paris, Estocolmo e outras cidades. Em nenhum dos casos os presentes passaram de algumas dezenas. Nenhum protesto atraiu atenção similar à que foi dada aos atos realizados em março no Exterior.

Na imprensa americana e europeia, suspeitas de corrupção contra parlamentares que decidiram o destino de Dilma mereceram referência. “Dilma é acusada no Brasil por parlamentares enfrentando seus próprios escândalos”, afirmou o jornal The New York Times na quinta-feira. “O aspecto que mais chama a atenção (...) é que grande parte dos políticos (...) deveria estar em uma situação tão ou mais complicada”, disse ontem a Agence France Presse.

Mesmo nesse terreno, porém, o Brasil está longe de ser exceção. Suspeitas de enriquecimento ilícito, desvios de verbas públicas e falsidade ideológica tornaram-se correntes tanto nas democracias emergentes quanto nas consolidadas. Na África do Sul, o parlamento rejeitou no início do mês um processo de impeachment contra o presidente Jacob Zuma por ter supostamente usado US$ 16 milhões do Tesouro para reformar a própria casa. 

O escândalo dos Papéis do Panamá chamuscou a imagem de 12 líderes mundiais, incluindo o presidente argentino, Mauricio Macri, que responde perante a Justiça pela participação não declarada ao Fisco em três empresas em paraísos fiscais. Pelo menos um governante envolvido foi obrigado a renunciar – o premier da Islândia, Sigmundur Gunnlaugsson. No Brasil, a tradição é oposta: suspeitos de corrupção encontram em cargos de primeiro escalão e mandatos parlamentares um porto seguro para escapar da prisão.

Nenhum comentário: