Jaime Cimenti
Brasil do fim do século XX e início do XXI
DIVULGAÇÃO/JC
O quinto romance do escritor Fernando Molica, nascido no Rio de Janeiro em 1961, Uma selfie com Lenin (Record, 112 páginas), acima de tudo, faz uma narrativa que retrata o Brasil entre fins do século XX e início do XXI.
Molica é autor dos romances Notícias do Mirandão e Inventário de Julio Reis, publicados pela Record, do livro-reportagem O homem que morreu três vezes (Record) e da narrativa infantojuvenil O misterioso craque da Vila Belmira, editado pelo Rocco. Molica já teve dois de seus livros lançados na Alemanha e por duas vezes foi finalista do Prêmio Jabuti.
Em Uma selfie para Lenin, o leitor vai acompanhar a trajetória altamente conflitante de um jornalista que vê seus ideais de juventude serem corroídos pelo galopante avanço de uma estrutura política baseada na corrupção. Tema, aliás, de dura atualidade para nós brasileiros.
O protagonista conta, com humor e certa dose de melancolia, seus caminhos profissionais e os rumos tortuosos que acabou trilhando pela vida. O romance está escrito em formato de longuíssima carta, redigida durante um voo internacional, na qual o protagonista tenta, ao menos, fazer um ambicioso balanço de sua vida. Correspondência íntima, próxima da confissão, a carta revela para o leitor as muitas contradições do personagem. O leitor vai pensar se o narrador está em busca de sentido ou se está relatando passos que planejou. Acerto de contas ou registro de viagem programada?
Entre as idas e vindas pessoais e profissionais do protagonista, o leitor vai apreciando retratos de nossa história recente, dessas últimas décadas, tão tumultuadas. As muitas transformações e contradições do mundo contemporâneo estão emboladas com os trajetos do personagem.
A selfie, índice máximo do individualismo promovido pelas redes sociais, é aqui realizada pelo narrador desiludido, buscando registrar seu encontro com um monumento em homenagem a um dos símbolos da busca por uma sociedade mais igualitária, Lenin.Com olhar irônico, o autor da carta vai descrevendo o vertiginoso declínio de determinados ideários políticos e, ao mesmo tempo, fala da ausência de novas alternativas.
"Acordei com o dia claro, envolto em lençóis úmidos, manchados pelo sangue que saíra da minha perna. Doia um pouco. Levantei, catei as roupas no chão, joguei tudo no box e tive, enfim, coragem de me ver no espelho. Eu envelhecera, Eloisa." Este é um dos trechos do romance, uma amostra da narrativa forte e impactante, dessas que têm tudo a ver com os tempos velozes, estilhaçados e doidos que vivemos.
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