quinta-feira, 30 de março de 2023


AS TRÊS TROUXAs

Michelle Yeoh, 60 anos: alguns dirão que uma idosa ganhou o Oscar

Você deve ter visto. Três panacas, calouras de Biomedicina de uma universidade de Bauru, no interior de São Paulo, viralizaram com um vídeo em que debochavam de uma colega mais velha.

Panaca 1: Gente, quiz do dia: como desmatricula uma colega de sala?

Panaca 2: Mano, ela tem 40 anos já. Era para estar aposentada.

Panaca 3: Realmente.

Panaca 1: Gente, 40 anos não pode mais (sic) fazer faculdade. Eu tenho essa opinião.

Depois as três ainda falavam, achando engraçadíssimo, que a colega não deveria nem saber o que é Google. Encerravam o vídeo aos risos, divertidas com a esperteza do post.

Só que não – óbvio. Assim que o vídeo das três patetas ganhou o mundo, os alunos se solidarizaram com a colega humilhada que, depois de muito trabalhar na vida, enfim estava realizando o sonho de cursar uma faculdade.

Patrícia Linares, de 44 anos, contou ao g1 que assistiu ao vídeo dentro da sala de aula, enquanto se preparava para apresentar um trabalho. E chorou muito. Engraçado que a sensação dela foi a de ficar com vergonha, quando vergonha deveriam ter as três pamonhas. Só que essas, à moda de todo burro orgulhoso, filmaram sua ignorância e seus preconceitos como se estivessem abafando.

Não demorou para uma das três vir a público se mostrando arrependida. “Nunca foi intenção dizer que pessoas de mais idade não podem adquirir uma graduação, pois não tenho esse pensamento. Foi uma fala imprudente e infeliz que tomou uma proporção que não imaginávamos”.

De onde se conclui que foi a proporção – que elas não imaginavam – que motivou o arrependimento. Isso acontece muito: criatura faz cacaca e depois chora na frente da câmera não pelo que causou ao outro, mas pelo que pode acontecer com ela mesma. É um clássico.A universidade prometeu tomar medidas administrativas a respeito do caso, o que parece ter se resumido a uma advertência de caráter educativo, seja lá o que isso signifique. Não deve ser ajoelhar no milho. Talvez um boleto extra para pagar, o que vai penalizar os pais das três bananas.

Agora: que elas não estão sozinhas nessa praga modernamente chamada de etarismo, não estão mesmo. Nem é de hoje que qualquer mulher mais velha é ridicularizada se aparece com uma roupa mais curta, ou um cabelo colorido, ou uma tatuagem. Lembra da Beth Faria quase linchada há alguns anos por ir à praia de biquíni?

Os jornais também não aliviam. Há pouco uma matéria informava sobre um homem de 60 anos que foi atropelado enquanto corria, e que só sobreviveu devido ao seu histórico de atleta (entendedores entenderão a referência). Pois bem. O homem foi impiedosamente chamado de idoso pelo jovem repórter de, sei lá, 20 e poucos anos. O idoso foi arrastado pelo carro. O idoso teve fraturas múltiplas. O idoso permanece na UTI. Na ilustração, o idoso era visto de calção e camiseta coladinha, disputando uma maratona alguns dias antes da desdita.

Nos comentários da notícia, alguns leitores repararam: não basta o sujeito passar por tudo isso e ainda o chamam de idoso do início ao fim da matéria. Se esse aí é idoso, vão chamar meu bisavô de múmia. E etc etc etc.

Não que seja errado chamar uma pessoa de 60 anos de idosa, cujos sinônimos são velha, antiga, anciã, vetusta. Só não faz muito sentido, considerando tudo o que alguém de 60 anos tem para produzir e viver. Já nas ocasiões em que deveria haver vantagem nesse conceito, passe livre no ônibus, por exemplo, a idade foi aumentada para 65 anos. Agora tem que ser pós-idoso.

Tomara que a moça de 44 anos continue sua graduação, independentemente do preconceito de quem seja. E que se forme com aproveitamento superior ao das três trouxas, que periga mudarem de ideia e de curso muitas vezes ainda, como é comum entre os mais novos.

Correndo o risco de ser acusada de etarismo reverso, se é que isso existe, encerro com Nelson Rodrigues: o jovem tem todos os defeitos do adulto e mais um, o da inexperiência.

E ainda: jovens, envelheçam.

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