18 DE MARÇO DE 2023
OPINIÃO DA RBS
ORDEM NA CASA
Uma das promessas do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, ainda durante a campanha, era a previsibilidade. Foi um posicionamento voltado especialmente para a classe empresarial, que, sem surpresas no horizonte, poderia planejar seus negócios e investimentos confiando que o governo não seria fonte de sobressaltos. Parece, no entanto, que parte do primeiro escalão não assimilou a mensagem. Ou ainda há certa desarticulação entre o Palácio do Planalto e a Esplanada dos Ministérios.
Visivelmente incomodado, mas sem citar nomes ou episódios, Lula deu na terça-feira um pito nos colaboradores que lançam propostas e programas ao vento, sem a chancela do núcleo da gestão. Com uma pitada de ironia, o presidente pediu que os autores das "genialidades" levassem antes as ideias para serem discutidas na Casa Civil. Uma vez aprovadas, seriam incorporadas como iniciativas de governo. Foi uma clara tentativa de impor um freio de arrumação após uma série de declarações e proposições que surgiram e causaram surpresa.
Um dos primeiros episódios foi o do ministro do Trabalho, Luiz Marinho, que declarou ter a intenção de acabar com o saque-aniversário do FGTS. Teve de recuar. O titular da Previdência, Carlos Lupi, falou em rever a reforma da Previdência. Acabou desmentido. Mais recentemente, o ministro de Portos e Aeroportos, Márcio França, anunciou o programa Voa Brasil, destinado a assegurar passagens a R$ 200 para aposentados, estudantes e servidores públicos. A iniciativa tinha estimativa de data para iniciar e projeção de número de bilhetes emitidos. Mas o Planalto foi pego no contrapé.
Os desencontros, com consequências mais graves, continuaram com a decisão de segunda-feira do Conselho Nacional da Previdência Social de forçar a redução da taxa de juros para o crédito consignado a aposentados e pensionistas - de 2,14% para 1,7% ao ano. A ideia, outra vez, foi orquestrada pelo ministro Lupi, que acabou criticado nos bastidores pela falta de discussões adequadas na Casa Civil e na Fazenda.
O resultado desastroso foi a decisão de vários bancos de suspender linhas de crédito consignado. A posição foi seguida inclusive por Banco do Brasil e Caixa, instituições ligadas ao governo. Isso mostra o quanto a deliberação foi surpreendente e tem sustentabilidade duvidosa. Embora redução de juro seja desejável, baixar taxas na marra é sempre algo temerário por ter efeitos colaterais. O Planalto, além disso, ficou em uma sinuca de bico. Afinal, se recuar e decidir pela volta do juro mais alto, corre o risco de desgaste por ser algo naturalmente impopular. Sequer está em questão, aqui, a viabilidade da medida, mas a forma atabalhoada como foi definida.
Pode-se ser benevolente e creditar a falta de sintonia ao fato de o governo ser recente, com menos de cem dias. Mas os ministros envolvidos não são neófitos em funções públicas relevantes. É preciso ter cuidado com voluntarismos. A continuidade da desorganização, alimentando ruídos, tem o potencial de gerar frustração, minar a credibilidade e comprometer a promessa de previsibilidade de Lula. Está faltando ordem na casa.
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