31 DE AGOSTO DE 2020
+ ECONOMIA - Fábio Astrauskas, CEO da Siegen Consultoria e professor do Insper
RESPOSTAS CAPITAIS: "Não é possível viver em ambiente tão desigual"
CEO da Siegen Consultoria, Fábio Astrauskas avalia que a retomada econômica depende, em parte, de uma reforma tributária com taxação de grandes fortunas. Na entrevista a seguir, o economista, que também é professor do Insper, analisa o cenário para os negócios e demonstra preocupação com o alto nível de desigualdade social, evidenciado no país pela pandemia de coronavírus.
Como descreve o momento da economia no país?
Medidas de auxílio emergencial e proteção de empregos funcionaram razoavelmente bem, apesar das críticas, e estão sendo prorrogadas. Enquanto isso, o Judiciário atuou para que credores e devedores conversassem sem entrar em litígio, mas é algo que está acabando. Então, precisamos criar regra mais clara para tratar do assunto. Em relação ao distanciamento social, estamos retornando à normalidade, mas em nível muito alto da pandemia, ao contrário de outros países. Isso gera insegurança para o consumo. Ou seja, temos efeito mais prolongado na economia. Em 2021, provavelmente teremos de lidar com o teto de gastos. Mas vai ser muito difícil mantê-lo com uma política de benefícios desenhada agora. Teremos a necessidade de fazer reforma tributária para melhorar a capacidade de arrecadação do Estado.
O IBGE divulga amanhã o resultado do PIB do segundo trimestre. Qual é sua projeção?
O PIB do segundo trimestre vai refletir o centro da pandemia, os piores meses, de abril a junho. É bastante provável que o tombo fique perto de 10%. O impacto do coronavírus se deu de maneira desigual na economia. O setor de serviços foi mais afetado.
Tensão recente atingiu o Ministério da Economia, com a debandada de secretários. A situação preocupa?
Preocupa em dois cenários. Um é o especulativo, em bolsa de valores e câmbio. Do ponto de vista de médio e longo prazos, o que estamos vendo é um debate entre a filosofia liberal, do ministro (Paulo) Guedes, e um viés mais assistencialista, por parte do presidente (Jair) Bolsonaro. O motivo pode até não ser tão nobre, mas me parece ser correto o pensamento que o Bolsonaro traduziu de que "não é possível tirar dos pobres para dar aos paupérrimos". Dá para pensar: "Ah, tem fundo eleitoreiro". Não importa. Vamos tirar isso da mesa e entender que é muito complicado criar um programa de transferência de renda. Só que é preciso tomar algumas atitudes para evitar a desigualdade brutal que vemos no Brasil. Falava-se do Renda Brasil com a retirada do Farmácia Popular, por exemplo. Não parece o melhor caminho.
Qual seria a saída?
A discussão vai ter de passar em algum momento pela tributação de grandes fortunas se quisermos respeitar teto de gastos e fazer política distributiva de renda. Sem isso, vamos ter de abandonar uma das duas coisas. Os países têm pensado em impostos sobre grandes fortunas. Por incrível que pareça, até grandes milionários têm pensado nisso. Estão percebendo o quão danosa a desigualdade pode ser para a sociedade e para o capitalismo. Isso tem de ser discutido com seriedade. Não é uma briga de empresário contra trabalhador, de rico contra pobre, de esquerda contra direita. É uma discussão simples. Não é possível viver em um ambiente tão desigual.
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