sexta-feira, 14 de agosto de 2020


14 DE AGOSTO DE 2020
EDUARDO BUENO

O tal neandertal

Desde os 10 ou 12 anos de idade, nutro genuína obsessão pelo homem (e, é claro, pela mulher) de Neandertal. Tudo começou com um livro infantojuvenil em cuja capa um belo espécime da dita raça exibia todo seu vigor primitivo - ou, vá lá, seu charme ancestral, pois agora a gente deve medir bem as palavras. Por causa dessa leitura inicial, acabei comprando meu primeiro livro com dinheiro próprio: era o clássico (como descobriria depois) A Pré-História, de Grahame Clark. Custou-me nove cruzeiros (Cr$ 9,00), na Globo da Rua da Praia. Tenho o livro até hoje (com o preço inscrito na última página).

Mas, desde aquele longínquo 1970 até hoje, escoou uma eternidade. E os conhecimentos científicos sobre esses nossos primos distantes deram um salto de que nem eles, com seus prodigiosos músculos, seriam capazes. Não dá mais para considerar os neandertais como brutos, toscos, grosseiros, mal-acabados, broncos, obtusos, néscios, asselvajados e, como dizer, burros. Muitíssimo pelo contrário: embora baixinhos, entroncados, peludos, com a cabeça oblonga e prognatas (feito uns presidentes que andam por aí), os neandertais eram (muito) mais fortes, (bem) mais resistentes, enxergavam (bastante) melhor e tinham o cérebro com volume 10% superior ao nosso.

Seus instrumentos de sílex cortavam melhor do que faca Ginsu. Eles inventaram uma cola mais grudenta do que Super Bonder. Suas lanças eram mais potentes. Eles dariam um peteleco na orelha do Schwarzenegger. Não usavam vestido nem usavam calção: inverno para eles era pleno verão, pois aguentavam 20 graus negativos mesmo se trajassem só uma casca de banana-nanica. Mas, então, por que diabos não estão mais entre nós? Bem, foram extintos por um supervulcão, que atende pelo nome de Campos Flégreos (vizinho ao Vesúvio) que entrou em erupção há uns 23 mil anos, matando quase tudo o que respirava na Europa e na Ásia Central. Nós, homens (e, claro, mulheres) sapiens, sobrevivemos só porque seguíamos na África e já havíamos ocupado o sudeste da Ásia e a Austrália.

Maldito vulcão! Se ao menos tivesse feito o serviço completo.

Mudando de saco para malas, ouso usar este nobre espaço para convocar uma manifestação para este domingo: vestidos de verde-amarelo e ignorando a quarentena, proponho que nos aglomeremos sem máscara para defender o inalienável direito de realizar transações em dinheiro vivo. Querem o quê: que a gente use dinheiro morto? Vamos deixar imóvel o mercado de imóveis? Olho vivo nesses que criticam famílias que adquiriram mais de 15 imóveis em dinheiro vivinho da silva. Devem ser como os neandertais do passado, que não têm nem onde cair mortos.

EDUARDO BUENO

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