27 DE AGOSTO DE 2020
L.F. VERISSIMO
Constantino
Lá pelos séculos 4º e 5º aconteceram mudanças na história cultural e intelectual do Ocidente que podem ser descritas, simplificando um pouco, como substituições no futebol: saem paganismo e racionalismo gregos, entram empiricismo romano e cristianismo. O apóstolo Paulo já fizera pouco, nas suas pregações, da "sapiência dos sábios" gregos e da "lógica vazia dos seus filósofos" em contraste com a sabedoria do Cristo, iniciando a conquista do pensamento ocidental pelo cristianismo, que avançaria no começo do século 4º com o imperador Constantino abrindo caminho para a cristã ser a única religião do império.
Para garantir o apoio dos teólogos e praticantes da nova e triunfante religião, Constantino iniciou outra tradição da Igreja além do anti-intelectualismo de Paulo e dos conflitos reincidentes entre doutrina cristã e ciência: estabeleceu que nem o clero nem as autoridades mais altas da Igreja precisavam pagar impostos. Assim, além do prestígio e do poder na Terra e da certeza de um lugar no céu pela eternidade, os bispos tinham acesso a prazeres mundanos e riquezas não tributáveis. Bispos disputavam entre si os favores de patronos ricos e do próprio imperador do momento.
Pelo que se sabe dele, Constantino foi um bom imperador, bom na guerra, bom e generoso na vitória e competente como administrador do seu império, que manteve unido por mais tempo do que qualquer outro "césar" depois de Augusto. Não se sabe se foi um cristão convicto ou se usou a Igreja para fins políticos e práticos, mas o fato é que a grande migração da História, do racionalismo grego para o irracionalismo romano, para o que um estudioso da época chamou de "mistério, mágica e autoridade" da Igreja de Roma, não teria acontecido sem ele. E olha aí, Paulo Guedes: taxar igrejas ao invés de livros. Não é uma boa ideia?
L.F. VERISSIMO
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