sexta-feira, 20 de outubro de 2017



Condomínio Edifício Brasil 

O velho prédio do Condomínio Edifício Brasil foi construído há séculos. É construção concreta ou imaginária, ou suas colunas e lajes são poesia concreta, se você preferir. Índios moraram aqui em priscas eras, eram seus antigos donos, mas uns alternativos dizem que antes deles havia outros donos. 

Complicado, dilema para arqueólogos, antropólogos e historiadores. Depois dos índios e/ou antigos moradores, vieram alguns europeus, a maioria de fama duvidosa, e aí, no sol do trópico onde alguns dizem que não é possível criar uma civilização, foi se criando isso que está aí, com seus prós e contras, suas perdas e ganhos, e tudo mais. Tom Jobim disse que o condomínio não era para amadores, meio complicado de entender e explicar. 

Deus o tenha, saudades dele, o que tínhamos de mais de melhor e mais afinado. Na Austrália tem bastante sol e deu certo. Esse negócio de civilização só no frio não é bem assim. Os moradores pensam "das suas portas para dentro", falou Dona Clementina, síndica do prédio há alguns séculos. Disse que ninguém se preocupava com as áreas coletivas e que alguns residentes tomavam conta dos espaços que deveriam ser de todos e que, na prática, serviam para colocar móveis, comércio ou simplesmente para aumentar as áreas dos apartamentos. 

O prédio já contou com dezenas de síndicos, membros da realeza, civis e militares, doutores saídos de faculdades ou de escolas da vida, patrões e empregados e até um que foi professor de Geografia quando era moço e renunciou por causa de forças ocultas, não tão ocultas. O prédio foi construído no interior, depois foi desmontado e levado para o litoral metropolitano e, mais tarde, voltou a ser construído no interior. Interior que virou metrópole. 

Mas isso não importa muito. Há pouco, parte dos moradores, em meio a muitas e acaloradas discussões, fez um movimento pedindo a troca da síndica, pois a economia do prédio estava complicada, e aí assumiu o subsíndico, agora também questionado. Os moradores querem um prédio ético, desenvolvido, com segurança, educação, saúde, dinheiro e direitos para todos. Os Três Poderes "harmônicos e independentes entre si", previstos no regimento para regrar, administrar e julgar atuam. 

Os moradores, desconfiados, centenas de pulgas atrás das orelhas, esperam que as autoridades não sejam autoritárias demais, que pensem no bem público, nos interesses coletivos e no desenvolvimento com paz e segurança. Há moradores que seguem pensando nos seus interesses, "das suas portas para dentro"; há moradores que foram para Portugal, Miami ou Paraguai; uns não estão nem aí, e outros se articulam na frente do prédio mostrando insatisfação e exigindo rumos certos. Não está fácil. 

Mediadores e líderes são aguardados, e muitos rezam para Nossa Senhora Aparecida para soluções em paz, sem palavras e gestos violentos ou balas de revólver. Além das eternas e únicas certezas: morrer e pagar cada vez mais impostos, os moradores sonham com a certeza de um Brasil melhor. 

a propósito... 

Na próxima assembleia geral do condomínio, os residentes pretendem implementar mais mudanças no prédio, quem sabe com novos administradores e com mais controle sobre os Poderes. Os moradores sabem também que precisam investir em educação, mudar hábitos e pensar mais no coletivo. Sabem que, se não for assim, será difícil o convívio pacífico da comunidade do prédio. 

Os moradores temem pela implosão do edifício, mas não querem ficar parados e têm consciência que precisam manter o clima de boas mudanças e lavagens que estão em curso. - Jornal do Comércio (http://jcrs.uol.com.br/_conteudo/2017/10/colunas/livros/591270-europa-e-uniao-europeia.html)

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