segunda-feira, 23 de outubro de 2017


23 DE OUTUBRO DE 2017
CLÁUDIA LAITANO

O incrível museu que encolheu


Se os pais soubessem tudo o que se passa no celular dos filhos quando eles não estão por perto, e mesmo quando estão, talvez não conseguissem pregar o olho à noite. Violência, pornografia, fóruns de debates em que assuntos como suicídio e anorexia são tratados de forma irresponsável e perigosa - além de tudo aquilo que a maioria de nós, adultos, nem sequer imagina que aconteça na rede - tornaram-se territórios tão acessíveis para crianças e adolescentes quanto a pracinha do bairro.

Diante desse poço de águas turvas onde os filhos passam boa parte do dia mergulhados, sem boias de segurança ou uma noção muito clara dos riscos a que estão expostos, os adultos podem encarar o problema de frente, deixando claro que estão na área, atentos e disponíveis, ou podem fingir que o maior perigo na internet é o vírus de computador.

Com essa janela aberta para experiências virtuais de toda natureza ao alcance da mão a qualquer momento, chega a ser cômico que tanta atenção esteja sendo destinada ao conteúdo disponível nos museus brasileiros - locais muito raramente frequentados por crianças e adolescentes que não tenham sido arrastados para lá por insistência dos pais ou exigência da escola.

A decisão do Museu de Arte de São Paulo (Masp) de proibir a entrada de menores de 18 anos, mesmo acompanhados dos responsáveis, na recém inaugurada exposição Histórias da Sexualidade - na esteira do neoconservadorismo extemporâneo que tem contaminado o debate público desde o cancelamento da exposição Queermuseu, apequenando instituições culturais até então respeitadas - parece não apenas covarde como inconstitucional.

Desde a Constituição de 1988, a classificação etária de obras de arte é uma sugestão do Estado, que pode ou não ser acatada pelos pais. Concedo que muitas famílias prefiram ver os adolescentes imersos nas águas profundas da internet - aquele lugar onde nada do que acontece tem vigilância ou classificação indicativa - a dar-se ao trabalho de acompanhá-los até um museu para falar, por exemplo, sobre sexo, nudez e arte, mas considero francamente abusivo que outros pais sejam impedidos de decidir o que é adequado ou não para os seus filhos. Tem só um nome para isso: censura.

* O colunista Luis Fernando Verissimo está em férias.

Nenhum comentário: