22 de setembro de 2016 | N° 18641
EDITORIAIS ZH
A TESE DA PERSEGUIÇÃO
Ao aceitar a denúncia do Ministério Público contra o ex-presidente Lula e colocá-lo no banco dos réus da Operação Lava-Jato por corrupção passiva e lavagem de dinheiro, o juiz Sergio Moro adotou procedimento semelhante ao que o levou a condenar ou absolver banqueiros, empresários, servidores públicos, doleiros e políticos de pelo menos três partidos. Ainda que os crimes de que o ex-presidente é acusado possam parecer pouco relevantes quando confrontados com os desvios de grandes somas atribuídos a outros réus, o dever da Justiça é julgar se ele recebeu ou não algum tipo de propina dos saqueadores da Petrobras, independentemente do valor.
O que importa é que ele tenha um julgamento justo, com oportunidade para se defender e, se for o caso, comprovar sua inocência. Só não cabe é partir da presunção de que ele está sofrendo perseguição política – justificativa raramente utilizada nas investigações, prisões e condenações de empresários, servidores e até mesmo dos políticos já condenados, os ex-deputados Pedro Corrêa (PP-PE), Luiz Argôlo (ex-SD-BA) e André Vargas (ex-PT-PR), além do ex-ministro José Dirceu (PT) e de João Vaccari, ex-tesoureiro do PT. Nem o Ministério Público nem o Judiciário merecem, até o momento, a suspeição de investigar e julgar por critérios ideológicos.
Ninguém ignora a dimensão política do ex-presidente, conquistada ao longo de uma carreira pública singular. Mas popularidade não significa imunidade. Lula, como qualquer outro brasileiro, tem que prestar contas à Justiça quando convocado para tal – e é isso o que está ocorrendo no momento. Evidentemente, sua notoriedade também não deve servir de pretexto para excessos e para condenações prévias.
ANISTIA EM CAUSA PRÓPRIA
Graças à obstrução dos pequenos partidos, foi abortada na Câmara no início da semana uma manobra destinada a anistiar parlamentares e ex-parlamentares que tiveram suas campanhas eleitorais financiadas por meio do caixa 2. Sob o pretexto de criminalizar a prática e dar andamento a uma das 10 medidas contra a corrupção propostas pelo Ministério Público Federal, lideranças dos principais partidos do Congresso tentaram dissociar os recursos de caixa 2 das doações decorrentes de propinas.
Em muitos casos, tal separação é impossível, mesmo que os doadores ouvidos pela Lava-Jato apresentem suas versões. O dinheiro não tem rótulo. Além disso, ambos os tipos de doações são irregulares. Por mais que os políticos aleguem que se trata de uma prática antiga ou tentem reduzi-la ao conceito de “recurso não contabilizado”, como alegou um tesoureiro de partido investigado pela Justiça, os tribunais já não aceitam tal flexibilização. Vale lembrar, por exemplo, o que disse no julgamento do mensalão, em 2012, a atual presidente do STF, ministra Cármen Lúcia: “Caixa 2 é crime; caixa 2 é uma agressão à sociedade brasileira”.
O curioso é que, depois da gritaria promovida pelos partidos menores, ninguém assumiu a autoria da manobra de autoanistia. Sabe-se que a costura do texto foi resultado de uma articulação suprapartidária, que vinha sendo feita havia algumas semanas, com o aval do presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ) e incluindo tanto partidos governistas, como PMDB, PSDB, DEM, PR e PP, quanto da oposição, como PT.
Não por coincidência, essas siglas têm vários integrantes na mira da Operação Lava-Jato.
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