15 de setembro de 2016 | N° 18635
DAVID COIMBRA
Lamento o que acontece com Lula
Fico triste com o que está acontecendo com o Lula. Não é deboche, nem ironia. Lula poderia ter sido peça importante na transformação do Brasil em um país melhor. Ao contrário, ele foi peça importante de uma grande desilusão.
Lula é político de fina intuição e de inteligência viva. Nestes dois particulares, assemelha-se a Brizola. Diferenciava-os a ideologia: Brizola tinha ideologia; Lula, não. Vantagem para Lula. Brizola aferrava-se a um nacionalismo antigo. Seu repetido discurso das “perdas internacionais” era algo que devia ter sido extinto com a carta-testamento de Getúlio, aquela que está gravada numa imensa pedra da Praça da Alfândega, monumento que, por feliz coincidência, assemelha-se a um fóssil.
Outro dia, vi um vídeo em que a socióloga Marilena Chaui dizia que Sergio Moro atua a mando da CIA para beneficiar as “Seis Irmãs” do petróleo. Foi como se tivesse entrado numa máquina do tempo e recuado à Guerra Fria. Alguns socialistas latino-americanos ainda reproduzem esse pensamento barroco, mas são poucos. Brizola às vezes vinha com teorias que tais. Lula, não. Lula jamais foi dogmático.
Já contei que o conheci nos anos 1980, quando era apenas uma curiosidade da política nacional. Era ainda tosco, mas exsudava carisma. Lula foi tateando, foi aprendendo na prática. Ao ser derrotado três vezes em eleições para a Presidência, compreendeu que o PT estava à margem da política brasileira. Você não vai ser campeão se não aceitar as regras do campeonato. A regra é a Constituição.
Em 1988, havia dois grupos de congressistas que se negavam a assinar a Constituição, apoquentando Ulysses Guimarães. Um era formado pelos petistas. O outro era por um homem só: Roberto Campos. A Constituição, no entanto, foi aprovada, e o Brasil passou a funcionar de acordo com seus mandamentos. Gostasse ou não Roberto Campos das novas leis, não fazia a menor diferença. Roberto Campos era irrelevante. Mas o PT se colocar como oposição sistemática e constante a tudo que ocorresse no país transformava o partido numa espécie de diretório acadêmico gigante. O PT parecia eternamente birrento e não ganharia nada, até que Lula lançou a famosa Carta aos Brasileiros. Foi quando o PT se inseriu na paisagem da política brasileira. Talvez até demais, como se vê hoje.
Lula cometeu muitos erros. O maior deles foi acreditar demais no próprio poder. Uma vez, o Marcelo Rech contou uma passagem acerca de Lula: viajando no avião presidencial, ele tentava abrir um sachê de alguma coisa, maionese, talvez, e não conseguia. Virou-se para um assessor e ordenou:
– Me lembra de eu resolver esse problema das embalagens no Brasil. Assim não dá!
Lula achava que era rei. Essa crença ficou demonstrada nas gravações de seus telefonemas. Ele queria mandar no Ministério Público, na Justiça, no governo, no Brasil.
A corrupção pela qual Lula é acusado é mesquinha, é corrupção muquirana, típica de quem se considera intocável. Ninguém mais é intocável no Brasil. Eis aí a verdadeira transformação. Eis aí, enfim, a mudança para melhor.
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