07 de setembro de 2016 | N° 18628
DAVID COIMBRA
Eu é que sou seu fã
Figura injustiçada e pouco conhecida, na política brasileira, foi Roberto Campos.
Roberto Campos está, para a política, como Zé Carlos está para o futebol.
Você se lembra do Zé Carlos? Volante do Cruzeiro de Minas. Jogava um futebol macio e escorreito como uma frase do Truman Capote, algo parecido com o Xavi, do Barcelona, só que com mais força e mais precisão no chute. Sobre ele, disse-me uma vez o Tostão:
– O Zé Carlos nunca deu um drible. E nunca errou um passe. Definição tão linda de jogador, que sempre a repito, para cansaço dos meus amigos.
O Tostão é mesmo craque, e não só com a bola no pé, mas com a caneta na mão, se você me permite tergiversar.
E, já que tergiverso, deixe-me contar outra história que volta e meia conto. É de Tostão. Você sabe que Tostão teve de abandonar prematuramente o futebol porque uma bolada no rosto lhe descolou a retina. Jamais esquecerei da foto dele saindo de campo com o rosto ensanguentado. Ficou tão ressentido com o destino, que desistiu da bola. Não via mais jogo, não falava mais sobre o assunto, anunciou que se dedicaria apenas à medicina e pediu que o chamassem de doutor Eduardo. Mas o amor pelo futebol é fogo que arde sem se ver, e Tostão voltou e se tornou um dos melhores comentaristas do Brasil.
Exercendo essa função, numa das Copas do Mundo, ele foi até a área de alimentação reservada para a imprensa, pegou no bar um sanduíche vulgar e sentou-se em um banco para enganar a fome. Surgiu, então, um senhor que, muito educadamente, perguntou se poderia sentar-se ao seu lado. Tostão disse que sim. E o senhor, acomodando-se, confessou:
– É que sou seu fã...
Aí, Tostão olhou melhor para suas feições e, perplexo, começou a gaguejar:
– M-as... E-espera aí... O senhor... Como o senhor se chama?
E ele:
– Alfredo. – Meu Deus! – exclamou Tostão. Era Alfredo Di Stéfano. Tostão, emocionado, o abraçou:
– Eu é que sou seu fã! E nós, meros mortais, fãs de ambos.
Mas, retomando a primeira tergiversação, digo que Zé Carlos era craque, e que deveria ter sido titular da Seleção Brasileira. Não foi porque era, também, tímido ao extremo. Em 1978, já veterano, Zé Carlos saiu do Cruzeiro e foi para o Guarani de Campinas. Tornou-se o vértice de um meio-campo famoso, formado também por Zenon e Renato, e liderou o time na conquista do Campeonato Brasileiro. Uma façanha.
Conheci Zé Carlos muito proximamente, quando eu e ele chegamos a Criciúma, em 1986. Ele foi o técnico do time que conquistou o primeiro campeonato estadual da história do clube, e eu era repórter do Diário Catarinense. Foi um bom ano para nós dois.
Zé Carlos é um homem humilde até em demasia. Não lhe faltava talento, faltava-lhe certa habilidade política, que era também o defeito de Roberto Campos, como destaquei no primeiro parágrafo. Aconteceu com Roberto Campos algo interessante, que, de certa forma, acontece agora. Mas tergiversei. Terei de voltar ao tema amanhã. Até.
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