quinta-feira, 1 de setembro de 2016



01 de setembro de 2016 | N° 18623 
CARLOS GERBASE

UM ALUNO COM UM CELULAR

Eu estava mostrando para meus alunos trechos dos célebres filmes-sinfonia: A propósito de Nice, de Jean Vigo; Somente as horas, de Alberto Cavalcanti; A chuva, de Joris Ivens; Berlin, sinfonia de uma metrópole, de Walter Ruttmann; e Um homem com uma câmera, de Dziga Vertov. São obras-primas dos anos 1920, criadas por realizadores que estabeleceram um diálogo inovador entre o cinema e as artes plásticas, com forte influência das vanguardas modernistas.

Quem quer compreender a evolução dos documentários precisa conhecer esses filmes, que contêm boas referências para quem deseja realizar obras experimentais, apostando na força expressiva das imagens. Enfim, uma aula que me parece bem útil para futuros cineastas. A maioria dos estudantes estava ligada na projeção. A maioria, mas não todos.

No fundo da aula, quatro estudantes, em vez de olhar para a tela comunitária sobre o quadro branco, olhavam para as telas individuais de seus celulares. Caminhei lentamente para lá, fiquei de pé perto deles, e nem assim interromperam suas sessões particulares. Não sei o que eles assistiam. Provavelmente estavam envolvidos com algum tipo de interação, e não com a experiência de apreciar uma obra audiovisual de outra pessoa.

É difícil para um professor entender como alguém que paga uma mensalidade muito alta, numa universidade particular, para aprender sobre cinema, prefere dedicar sua atenção ao que mostra a minúscula tela do seu smartphone, em vez de compartilhar os sons e as imagens que envolvem todas as outras pessoas na sala de aula. Mas é o que acontece, e de modo cada vez mais frequente.

Sei que o papel da educação é adaptar-se aos novos tempos e aos novos estudantes. Sei que as tecnologias em geral, e a internet em particular, devem ser aliadas dos professores. Sei que os smartphones são, em potencial, instrumentos úteis para dinâmicas de ensino inovadoras. 

Mas, às vezes, é preciso parar de interagir e simplesmente assistir a um filme. Ou não? Será que ver trechos de filmes e aprender com eles é estratégia superada? Será que os jovens cineastas não precisam mais conhecer os filmes-sinfonia? Estou em crise. Será que sou um professor que desaprendeu a ensinar?

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